8. Se um desses seres desconhecidos que consomem a sua
efêmera existência no fundo das tenebrosas regiões do
oceano; se um desses poligástricos, uma dessas nereidas
— miseráveis animáculos que da natureza mais não conhecem do que os peixes ictiófagos e as florestas submarinas — recebesse de repente o dom da inteligência, a faculdade de estudar o seu mundo e de basear suas apreciações
num raciocínio conjetural extensivo à universalidade das
coisas, que ideia faria da natureza viva que se desenvolve
no meio por ele habitado e do mundo terrestre que escapa
ao campo de suas observações? Se, agora, por maravilhoso efeito do poder da sua nova
faculdade, esse mesmo ser chegasse a elevar-se, acima das
suas trevas eternas, a galgar a superfície do mar, não distante das margens opulentas de uma ilha de esplêndida vegetação, banhada pelo Sol fecundante, dispensador de calor
benéfico, que juízo faria ele das suas antecipadas teorias
sobre a criação universal? Não as baniria, de pronto, substituindo-as por uma apreciação mais ampla, relativamente
tão incompleta quanto a primeira? Tal, ó homens, a
imagem da vossa ciência toda especulativa. *
* Tal também a situação dos negadores do mundo dos Espíritos,
quando, após se haverem despojado do envoltório carnal, contemplam, desdobrados às suas vistas, os horizontes desse mundo. Compreendem, então, quão ocas eram as teorias com que pretendiam
tudo explicar por meio exclusivamente da matéria. Contudo, esses
horizontes ainda lhes ocultam mistérios que só posteriormente se
lhes desvendam, à medida que, depurando-se, eles se elevam. Desde, porém, os seus primeiros momentos no outro mundo, veem-se
forçados a reconhecer a própria cegueira e quão longe estavam da
verdade.