Tradição muçulmana
Extraímos a passagem seguinte da sábia e notável obra do Sr. Géraldy Saintine, publicada sob o título de Três Anos na Judéia.
“Quando o sultão de Babel Bakhtunnassar (Nabucodonosor) foi enviado por Deus para punir os filhos de Israel, que tinham abandonado a doutrina da unidade, ele despojou o templo de todos os objetos preciosos que ali se achavam. Reservando para si o trono de Salomão com seus suportes, os dois leões de ouro puro animados por uma arte mágica que defendiam a entrada, distribuiu o resto do saque aos diversos reis da corte. O rei de Roum recebeu as roupas de Adão e a vara de Moisés; o rei de Antakie teve o trono de Belkis e o pavão maravilhoso cuja cauda, toda em pedrarias, formava no trono um rico dossel; o rei de Andaluzia ficou com a mesa de ouro do Profeta. Um cofre de pedra, que continha a Torá (Bíblia) estava no meio de todas essas riquezas e ninguém lhe dava atenção, posto fosse o mais precioso de todos os tesouros. Assim, deixaram-no abandonado ao capricho dos salteadores que percorriam a cidade e o templo passando a mão em tudo o que encontravam; e o depósito da palavra divina desapareceu nessa imensa desordem.
“Quarenta anos mais tarde, estando aplacada a sua cólera, Deus resolveu restabelecer os filhos de Israel em sua herança e suscitou o Profeta Euzer (Esdras), ─ Que Deus o salve! ─ predestinado pela vontade divina, a uma missão gloriosa. Tinha ele passado toda a juventude na prece e na meditação, negligenciando as Ciências Humanas para se absorver na contemplação do Ser Infinito, e vivia separado do mundo, no fundo de uma das grutas que circundam a cidade santa. Essa gruta ainda hoje se chama el Azérie. * Obedecendo à ordem de Deus, saiu de seu retiro e veio para junto dos filhos de Israel, indicar-lhes como deveriam reconstruir o templo e restabelecer a honra dos antigos ritos.
“Mas o povo não acreditou na missão do profeta. Declarou que não se submeteria à lei; que até cessaria os trabalhos de construção do templo e iria habitar outras terras, se não lhe apresentassem o livro em que nosso senhor Moisés ─ Que Deus o salve! ─ tinha consignado todas as prescrições religiosas a ele ditadas no Monte Sinai. O livro havia desaparecido e todas as buscas para encontrá-lo tinham sido infrutíferas. “Euzer, então, nesse grande embaraço, fez a Deus fervorosas preces, para que o tirasse do sofrimento e impedisse o povo de persistir na via da perdição. Estava sentado debaixo de uma árvore, contemplando com tristeza as ruínas do templo, em redor do qual se agitava uma multidão indócil, quando uma voz do alto lhe ordenou que escrevesse. Embora jamais tivesse pegado num qalam (pena, pincel), obedeceu imediatamente. Depois da prece do meio dia até o dia seguinte à mesma hora, sem se alimentar e sem se levantar do solo santo onde estava sentado, continuou a escrever tudo o que lhe ditava a voz celeste, não hesitando um instante, nem se interrompendo diante das trevas da noite, porque uma luz sobrenatural iluminava o seu espírito e um anjo lhe guiava a mão.
“Todos os filhos de Israel estavam pasmados e contemplavam em silêncio essa manifestação da onipotência divina. Mas quando o profeta terminou sua cópia miraculosa, os imãs, invejosos do favor particular do qual ele acabava de ser objeto, pretenderam que o novo livro fosse uma invenção diabólica e que em nada se parecia com o antigo.
“Euzer voltou-se novamente à Bondade Infinita e, cedendo a uma inspiração súbita, dirigiu-se, seguido por todo o povo, para a fonte de Siloé. Chegado diante da fonte, levantou as mãos ao céu, fez uma longa e ardente prece, e toda a multidão se prosternou com ele. De repente, na superfície da água apareceu uma pedra quadrada, que flutuava como se sustentada por uma mão invisível. Nela os imãs reconheceram, trêmulos, a arca sagrada, há muito perdida. Euzer a tomou com respeito. A arca abriu-se por si mesma. A Torá de Moisés saiu dela, como se animada de vida própria, e a nova cópia, escapando-se do seio do profeta, foi colocar-se na caixa sagrada.
“Não era mais possível a dúvida. Contudo, o santo homem exigiu que os imãs confrontassem os dois exemplares. Estes, a despeito de sua confusão, obedeceram à sua vontade. Após longo exame, testemunharam em altas vozes que nenhuma palavra, nenhum kareket (acento) apresentava a menor diferença entre o livro escrito por Euzer e o que tinha sido traçado por Moisés. Desde que prestaram essa homenagem à verdade, Deus, para puni-los por seus primeiros erros, apagou os seus olhos e os mergulhou em trevas eternas.
“Foi assim que os filhos de Israel foram reconduzidos à fé dos seus pais. O lugar onde se havia sentado o chefe que Deus lhes tinha dado foi chamado depois Kerm ech Cheick (cercado ou vinha do Scheik).”
Quem não reconheceria no relato vários fenômenos espíritas que os médiuns reproduzem aos nossos olhos e que nada têm de sobrenatural?
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Nome árabe da gruta conhecida sob o nome do túmulo de lázaro.