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Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1868 > Maio
Maio
Correspondência inédita de Lavater - Com a Imperatriz Maria da Rússia
Sexta carta
Mui venerada Imperatriz,
Junto ainda uma carta chegada do mundo invisível! Possa ela, como as precedentes, ser apreciada por vós e sobre vós produzir um efeito salutar!
Aspiramos sem cessar uma comunicação mais íntima com o Amor, o mais puro que se haja manifestado no homem e se glorificou em Jesus, o Nazareno!
Mui venerada Imperatriz, nossa felicidade futura está em nosso poder, de vez que nos é concedida a graça de compreender que só o amor nos pode dar a felicidade suprema, e que só a fé no amor divino faz nascer em nossos corações o sentimento que nos torna eternamente felizes, a fé que desenvolve, depura e completa a nossa aptidão para amar.
Muitos temas ainda me restam para vos repassar. Procurarei acelerar a continuação do que comecei a vos expor, e me consideraria muito feliz se pudesse esperar ter podido ocupar agradavelmente e utilmente alguns momentos de vossa preciosa vida.
JEAN GASPAR LAVATER
Zurique, 16 de dezembro de 1798.
Junto ainda uma carta chegada do mundo invisível! Possa ela, como as precedentes, ser apreciada por vós e sobre vós produzir um efeito salutar!
Aspiramos sem cessar uma comunicação mais íntima com o Amor, o mais puro que se haja manifestado no homem e se glorificou em Jesus, o Nazareno!
Mui venerada Imperatriz, nossa felicidade futura está em nosso poder, de vez que nos é concedida a graça de compreender que só o amor nos pode dar a felicidade suprema, e que só a fé no amor divino faz nascer em nossos corações o sentimento que nos torna eternamente felizes, a fé que desenvolve, depura e completa a nossa aptidão para amar.
Muitos temas ainda me restam para vos repassar. Procurarei acelerar a continuação do que comecei a vos expor, e me consideraria muito feliz se pudesse esperar ter podido ocupar agradavelmente e utilmente alguns momentos de vossa preciosa vida.
JEAN GASPAR LAVATER
Zurique, 16 de dezembro de 1798.
Carta de um defunto a seu amigo
Sobre as relações existentes entre os Espíritos e aqueles que eles amaram na Terra
Meu bem amado, antes de tudo devo advertir-te que das mil coisas que, estimulado por uma nobre curiosidade, desejas aprender de mim, e que eu teria tanto desejo de poder dizer-te, ouso apenas comunicar-te uma só, pois de mim não dependo, absolutamente. Minha vontade depende, conforme já te disse, da vontade daquele que é a suprema sabedoria. Minhas relações contigo não são baseadas senão no teu amor. Esta sabedoria, este amor personificados, muitas vezes nos impelem, a mim e aos meus mil vezes mil convivas de uma felicidade que se torna continuamente mais elevada e embriagadora, para os homens ainda mortais, e nos fazem entrar com eles em relações certamente agradáveis para nós, embora muitas vezes obscurecidas e nem sempre bastante puras e santas. Recebe de mim algumas noções acerca destas relações. Não sei como conseguirei fazer-te compreender esta grande verdade que provavelmente te espantará muito, malgrado a sua realidade. É que nossa própria felicidade muitas vezes depende, relativamente, bem entendido, do estado moral daqueles que deixamos na Terra e com os quais entramos em relações diretas.
Seu sentimento religioso nos atrai; sua impiedade nos repele.
Nós nos regozijamos com suas puras e nobres alegrias, isto é, com suas alegrias espirituais desinteressadas. Seu amor contribui para a nossa felicidade; assim, sentimos, senão um sentimento semelhante ao sofrimento, ao menos uma diminuição de prazer, quando eles se deixam envolver-se em sombras por sua sensualidade, seu egoísmo, suas paixões animais ou pela impureza de seus desejos.
Meu amigo, peço-te que te detenhas ante estas palavras: envolver-se em sombras.
Todo pensamento divino produz um raio de luz, que jorra do homem amante, e que não é visto nem compreendido senão pelas naturezas amantes e radiantes. Toda espécie de amor tem seu raio de luz que lhe é particular. Esse raio, reunindo-se à auréola que cerca os santos, a torna ainda mais resplendente e mais agradável à visão. Do grau dessa claridade e dessa amenidade depende, muitas vezes, o grau de nossa própria felicidade, ou da felicidade que sentimos de nossa existência. Com o desaparecimento do amor, essa luz se extingue, e com ela o elemento de felicidade daqueles que nós amamos. Um homem que se torna estranho ao amor se envolve em sombra, no sentido mais literal e mais positivo do vocábulo; ele se torna mais material, e consequentemente mais elementar, mais terrestre, e as trevas da noite o cobrem com o seu véu. A vida, ou o que para nós é a mesma coisa: o amor do homem, produz o grau de sua luz, sua pureza luminosa, sua identidade com a luz, a magnificência de sua natureza.
Só estas últimas qualidades tornam possíveis e íntimas as nossas relações com ele. A luz atrai a luz. É-nos impossível agir sobre as almas sombrias. Todas as naturezas não amantes nos parecem sombrias. A vida de cada mortal, sua verdadeira vida, é como o seu amor; sua luz se assemelha ao seu amor; de sua luz decorre a nossa comunicação com ele e a sua conosco. Nosso elemento é a luz cujo segredo não é compreendido por nenhum mortal. Nós atraímos e somos atraídos por ela. Essa vestimenta, esse órgão, esse veículo, esse elemento, no qual reside a força primitiva que tudo produz, a luz, numa palavra, forma para nós o traço característico de todas as naturezas.
Nós clareamos na medida do nosso amor; reconhecem-nos por essa claridade, e somos atraídos por todas as naturezas amantes e radiantes como nós. Por efeito de um movimento imperceptível, dando uma certa direção aos nossos raios, nós podemos fazer nascer em naturezas que nos são simpáticas, ideias mais humanas, suscitar ações, sentimentos mais nobres e mais elevados; mas não temos o poder de forçar ou de dominar ninguém, nem de impor a nossa vontade aos homens cuja vontade é inteiramente independente da nossa. O livre-arbítrio do homem nos é sagrado. É-nos impossível transmitir um só raio de nossa pura luz a um homem a quem falta sensibilidade. Ele não possui nenhum sentido, nenhum órgão para poder receber de nós a menor coisa. Do grau de sensibilidade que possui um homem depende ─ Oh! Permite-me repeti-lo em cada uma de minhas cartas, ─ sua aptidão para receber a luz, sua simpatia com todas as naturezas luminosas e com o seu protótipo primordial. Da ausência da luz nasce a incapacidade de aproximar-se das fontes da luz, ao passo que milhares de naturezas luminosas podem ser atraídas por uma só natureza semelhante.
O Homem-Jesus, resplendente de luz e de amor, foi o ponto luminoso que incessantemente atraía para si legiões de anjos. Naturezas sombrias, egoístas, atraem para si Espíritos sombrios, grosseiros, privados de luz, malévolos, e são mais envenenadas por eles, ao passo que as almas amantes ainda se tornam mais puras e mais amantes, por seu contato com os Espíritos bons e amantes.
Jacob adormecido, cheio de sentimentos piedosos, vê os anjos do Senhor chegarem até ele em multidão, e a sombria alma de Judas Iscariotes dá ao chefe dos Espíritos sombrios o direito, direi mesmo o poder, de penetrar na sombria atmosfera de sua natureza odienta. Os Espíritos radiosos são abundantes onde se encontra um Elíseo; legiões de Espíritos sombrios pululam entre as almas sombrias.
Meu bem amado, medita bem no que acabo de dizer-te. Encontrarás numerosas aplicações para isto nos livros bíblicos, que encerram verdades ainda intactas, assim como instruções da mais alta importância, concernentes às relações que existem entre os mortais e os imortais, entre o mundo material e o mundo dos Espíritos.
Não depende senão de ti encontrar-te sob a influência benéfica dos Espíritos amantes ou de afastá-los de ti; podes mantê-los junto a ti ou forçá-los a te deixar. Depende de ti tornar-me mais ou menos feliz.
Agora deves compreender que todo ser amante torna-se mais feliz quando encontra um ser tão amante quanto ele; que o mais feliz e o mais puro dos seres torna-se menos feliz quando encontra uma diminuição de amor naquele que ama; que o amor abre o coração ao amor, e que a ausência desse sentimento torna mais difícil, por vezes mesmo impossível, o acesso de toda comunicação íntima.
Se desejas tornar-me, a mim que já desfruto da felicidade suprema, ainda mais feliz, torna-te ainda melhor. Por isto, tu me tornarás mais radioso e poderás simpatizar com todas as naturezas radiosas e imortais. Elas se apressarão a vir para junto de ti; sua luz reunir-se-á à tua e a tua à deles; sua presença tornar-te-á mais puro, mais radiante, mais vivaz e, o que te parecerá difícil acreditar, mas não o é por isto menos positivo, por efeito de tua luz, aquela que radiará de ti, elas mesmas tomar-se-ão mais luminosas, mais vivazes, mais felizes de sua existência, e, por efeito de teu amor, ainda mais amantes.
Meu bem-amado, existem relações imperecíveis entre o que chamais de mundos visível e invisível; uma comunhão incessante entre os habitantes da Terra e os do Céu, que sabem amar; uma ação benéfica recíproca de cada um desses mundos sobre o outro.
Meditando e analisando esta ideia com cuidado, reconhecerás cada vez mais a sua verdade, a sua urgência e a sua santidade.
Não te esqueças, irmão da Terra: tu vives visivelmente num mundo que ainda é invisível para ti!
Não o esqueças! No mundo dos Espíritos amantes, alegrar-se-ão por teu crescimento em amor puro e desinteressado!
Achamo-nos junto a ti, quando nos julgas bem longe. Jamais um ser amante se acha só e isolado.
A luz do amor atravessa as trevas do mundo material, para entrar num mundo menos material.
Os Espírito amantes e luminosos acham-se sempre na vizinhança do amor e da luz.
Estas palavras do Cristo são literalmente verdadeiras: “Onde estiverem reunidos dois ou três em meu nome, aí estarei com eles.”
Também é indubitavelmente certo que podemos afligir o Espírito de Deus por nosso egoísmo, e alegrá-lo por nosso verdadeiro amor, conforme o profundo sentido destas palavras: O que ligardes na Terra será ligado no Céu; o que desligardes na Terra será também desligado no Céu. Desligais pelo egoísmo, ligais pela caridade, isto é, pelo amor. Vós vos aproximais e vos afastais de nós. Nada é mais claramente compreendido no Céu do que o amor dos que amam na Terra.
Nada é mais atraente para os Espíritos bem-aventurados pertencentes a todos os graus de perfeição, do que o amor dos filhos da Terra.
Vós, que ainda sois chamados mortais, pelo amor podeis fazer descer o Céu sobre a Terra.
Poderíeis entrar conosco, bem-aventurados, numa comunicação infinitamente mais íntima do que podeis supor, se vossas almas se abrissem à nossa influência pelos impulsos do coração.
Muitas vezes estou junto a ti, meu bem-amado! Gosto de me encontrar na tua esfera de luz.
Permite-me dirigir-te ainda algumas palavras de confiança.
Quando te aborreces, a luz que irradia de ti, no momento em que pensas nos que tu amas ou nos que sofrem, se obscurece e, então, sou forçado a afastar-me de ti, pois nenhum Espírito amante pode suportar as trevas da cólera. Ainda recentemente tive que deixar-te. Eu, por assim dizer, te perdi de vista e me dirigi para outro amigo, ou antes, a luz de seu amor me atraiu para si. Ele orava, derramando lágrimas por uma família benfeitora, momentaneamente caída na maior miséria e que ele não estava em condições de socorrer. Oh! Como seu corpo terrestre já me parecia luminoso; foi como se uma claridade deslumbrante o inundasse. Nosso Senhor aproximou-se dele e um raio de seu espírito caiu nessa luz. Que felicidade para mim poder mergulhar nessa auréola e, retemperado por essa luz, estar em estado de inspirar à sua alma a esperança de um socorro próximo! Pareceu-me ouvir uma voz do fundo de sua alma, dizer-lhe: “Nada temas! Crê! Desfrutarás a alegria de poder aliviar aqueles por quem acabas de pedir a Deus.” Ele se ergueu inundado de alegria depois da prece. No mesmo instante fui atraído para outro ser radioso, também em prece... Era a nobre alma de uma virgem que orava e dizia: “Senhor! Ensina-me a fazer o bem segundo a tua vontade.” Pude e ousei inspirar-lhe a seguinte ideia: “Não farei bem mandando a esse homem caridoso, que conheço, um pouco de dinheiro, para que o empregue, ainda hoje, em proveito de alguma família pobre?”
Ela apegou-se a esta ideia com uma alegria infantil; recebeu-a como se tivesse recebido um anjo descido do Céu. Essa alma piedosa e caritativa reuniu uma soma considerável; depois escreveu uma cartinha muito afetuosa, dirigida àquele por quem acabava de orar, e que a recebeu, assim como o dinheiro, apenas uma hora depois de sua prece, derramando lágrimas de alegria e cheio de um profundo reconhecimento a Deus!
Eu o segui desfrutando eu mesmo uma suprema felicidade e alegrando-me em sua luz. Ele chegou à porta da pobre família. “Deus terá tido piedade de nós?” perguntava a piedosa esposa a seu piedoso marido. ─ “Sim, ele terá piedade de nós, como nós tivemos tido piedade dos outros.” ─ Ouvindo essa resposta do marido, aquele que tinha orado encheu-se de alegria; abriu a porta e, sufocado por sua ternura, apenas pôde pronunciar estas palavras: “Sim ele terá piedade de vós, como vós mesmos tivestes piedade dos pobres; eis uma dádiva da misericórdia de Deus. O Senhor vê os justos e ouve as suas súplicas.”
Com que viva luz brilharam todos os assistentes, quando, depois de ter lido a cartinha, levantaram os olhos e os braços para o céu! Massas de Espíritos se apressaram a vir de todos os lados. Como nos alegramos! Como nos abraçamos!
Como todos louvamos a Deus e o bendizemos! Como todos nos tornamos mais perfeitos, mais amantes!
Tu brilhaste outra vez; eu pude e ousei chegar junto a ti; tu tinhas feito três coisas que me conferiam o direito de aproximar-me de ti e de te alegrar. Tinhas derramado lágrimas de vergonha por tua cólera; tinhas refletido, ficando seriamente enternecido pelos meios de poder dominar-te; sinceramente tinhas pedido perdão àquele a quem o teu comportamento havia ofendido e buscavas de que maneira poderias compensá-lo, proporcionando-lhe alguma satisfação. Essa preocupação restituiu a calma ao teu coração, a alegria aos teus olhos, a luz ao teu corpo.
Por este exemplo podes julgar se estamos sempre bem instruídos do que fazem os amigos que deixamos na Terra, e quanto nos interessamos por seu estado moral. Agora também deves compreender a solidariedade que existe entre o mundo visível e o mundo invisível, e que de vós depende proporcionar-nos alegrias ou aflições.
Oh! meu bem-amado, se pudesses compenetrar-te desta grande verdade, que um amor nobre e puro encontra em si mesmo sua mais bela recompensa; que os mais puros gozos, o gozo de Deus, não são senão o produto de um sentimento mais depurado, apressar-te-ias em te depurares de tudo o que é egoísmo.
De agora em diante, jamais poderei escrever-te sem voltar a este assunto. Nada tem preço sem o amor. Só ele possui o golpe de vista claro, justo, penetrante, para distinguir o que merece ser estudado, o que é eminentemente verdadeiro, divino, imperecível. Em cada ser mortal e imortal animado de um amor puro nós vemos, com um inexprimível sentimento de prazer, refletir-se o próprio Deus, como vedes o sol brilhar em cada gota de água pura. Todos os que amam, na Terra como no Céu, não fazem senão um pelo sentimento. É do grau do amor que depende o grau de nossa perfeição, é de nossa felicidade interior e exterior. É teu amor que regula tuas relações com os Espíritos que deixaram a Terra, tua comunicação com eles, a influência que podem exercer sobre ti e sua ligação íntima com o teu Espírito.
Escrevendo-te isto, um sentimento de previsão que jamais me engana, ensiname que tu te achas neste momento em excelente disposição moral, porquanto pensas numa obra de caridade. Cada uma de vossas ações, de vossos pensamentos, leva um cunho particular, instantaneamente compreendido e apreciado por todos os Espíritos desencarnados. Que Deus venha em teu auxílio.
Escrevi isto a 16 de dezembro de 1798.
Seria supérfluo ressaltar a importância destas cartas de Lavater, que por toda parte excitaram o mais vivo interesse. Elas atestam, de sua parte, não só o conhecimento dos princípios fundamentais do Espiritismo, mas uma justa apreciação de suas consequências morais. Apenas sobre alguns pontos ele parece ter tido ideias um pouco diferentes do que hoje sabemos, mas a causa dessas divergências, que aliás talvez se devam mais à forma do que ao fundo, está explicada na comunicação seguinte, por ele dada na Sociedade de Paris. Nós não as levantaremos, porque cada um as terá compreendido; o essencial era constatar que, muito antes do aparecimento oficial do Espiritismo, homens cuja alta inteligência não poderia ser posta em dúvida, dele tiveram a intuição. Se não empregaram a palavra, é que ela não existia.
Contudo, chamaremos a atenção sobre um ponto que poderia parecer estranho. É a teoria segundo a qual a felicidade dos Espíritos estaria subordinada à pureza dos sentimentos dos encarnados e achar-se-ia alterada pela mais leve imperfeição destes. Se assim fosse, considerando o que são os homens, não haveria Espíritos realmente felizes, e a felicidade verdadeira não existiria no outro mundo, como não existe na Terra. Os Espíritos devem sofrer tanto menos os malefícios dos homens pelo fato de sabê-los perfectíveis. Os homens imperfeitos são para eles como crianças cuja educação não está concluída e na qual eles têm a missão de trabalhar, eles que igualmente passaram pela fieira da imperfeição. Mas se deixarmos de lado o que o princípio desenvolvido nesta carta pode ter de muito absoluto, não poderemos deixar de reconhecer um senso muito profundo, uma admirável penetração das leis que regem as relações do mundo visível e do mundo invisível, e das nuanças que caracterizam o grau de adiantamento dos Espíritos encarnados ou desencarnados.
Meu bem amado, antes de tudo devo advertir-te que das mil coisas que, estimulado por uma nobre curiosidade, desejas aprender de mim, e que eu teria tanto desejo de poder dizer-te, ouso apenas comunicar-te uma só, pois de mim não dependo, absolutamente. Minha vontade depende, conforme já te disse, da vontade daquele que é a suprema sabedoria. Minhas relações contigo não são baseadas senão no teu amor. Esta sabedoria, este amor personificados, muitas vezes nos impelem, a mim e aos meus mil vezes mil convivas de uma felicidade que se torna continuamente mais elevada e embriagadora, para os homens ainda mortais, e nos fazem entrar com eles em relações certamente agradáveis para nós, embora muitas vezes obscurecidas e nem sempre bastante puras e santas. Recebe de mim algumas noções acerca destas relações. Não sei como conseguirei fazer-te compreender esta grande verdade que provavelmente te espantará muito, malgrado a sua realidade. É que nossa própria felicidade muitas vezes depende, relativamente, bem entendido, do estado moral daqueles que deixamos na Terra e com os quais entramos em relações diretas.
Seu sentimento religioso nos atrai; sua impiedade nos repele.
Nós nos regozijamos com suas puras e nobres alegrias, isto é, com suas alegrias espirituais desinteressadas. Seu amor contribui para a nossa felicidade; assim, sentimos, senão um sentimento semelhante ao sofrimento, ao menos uma diminuição de prazer, quando eles se deixam envolver-se em sombras por sua sensualidade, seu egoísmo, suas paixões animais ou pela impureza de seus desejos.
Meu amigo, peço-te que te detenhas ante estas palavras: envolver-se em sombras.
Todo pensamento divino produz um raio de luz, que jorra do homem amante, e que não é visto nem compreendido senão pelas naturezas amantes e radiantes. Toda espécie de amor tem seu raio de luz que lhe é particular. Esse raio, reunindo-se à auréola que cerca os santos, a torna ainda mais resplendente e mais agradável à visão. Do grau dessa claridade e dessa amenidade depende, muitas vezes, o grau de nossa própria felicidade, ou da felicidade que sentimos de nossa existência. Com o desaparecimento do amor, essa luz se extingue, e com ela o elemento de felicidade daqueles que nós amamos. Um homem que se torna estranho ao amor se envolve em sombra, no sentido mais literal e mais positivo do vocábulo; ele se torna mais material, e consequentemente mais elementar, mais terrestre, e as trevas da noite o cobrem com o seu véu. A vida, ou o que para nós é a mesma coisa: o amor do homem, produz o grau de sua luz, sua pureza luminosa, sua identidade com a luz, a magnificência de sua natureza.
Só estas últimas qualidades tornam possíveis e íntimas as nossas relações com ele. A luz atrai a luz. É-nos impossível agir sobre as almas sombrias. Todas as naturezas não amantes nos parecem sombrias. A vida de cada mortal, sua verdadeira vida, é como o seu amor; sua luz se assemelha ao seu amor; de sua luz decorre a nossa comunicação com ele e a sua conosco. Nosso elemento é a luz cujo segredo não é compreendido por nenhum mortal. Nós atraímos e somos atraídos por ela. Essa vestimenta, esse órgão, esse veículo, esse elemento, no qual reside a força primitiva que tudo produz, a luz, numa palavra, forma para nós o traço característico de todas as naturezas.
Nós clareamos na medida do nosso amor; reconhecem-nos por essa claridade, e somos atraídos por todas as naturezas amantes e radiantes como nós. Por efeito de um movimento imperceptível, dando uma certa direção aos nossos raios, nós podemos fazer nascer em naturezas que nos são simpáticas, ideias mais humanas, suscitar ações, sentimentos mais nobres e mais elevados; mas não temos o poder de forçar ou de dominar ninguém, nem de impor a nossa vontade aos homens cuja vontade é inteiramente independente da nossa. O livre-arbítrio do homem nos é sagrado. É-nos impossível transmitir um só raio de nossa pura luz a um homem a quem falta sensibilidade. Ele não possui nenhum sentido, nenhum órgão para poder receber de nós a menor coisa. Do grau de sensibilidade que possui um homem depende ─ Oh! Permite-me repeti-lo em cada uma de minhas cartas, ─ sua aptidão para receber a luz, sua simpatia com todas as naturezas luminosas e com o seu protótipo primordial. Da ausência da luz nasce a incapacidade de aproximar-se das fontes da luz, ao passo que milhares de naturezas luminosas podem ser atraídas por uma só natureza semelhante.
O Homem-Jesus, resplendente de luz e de amor, foi o ponto luminoso que incessantemente atraía para si legiões de anjos. Naturezas sombrias, egoístas, atraem para si Espíritos sombrios, grosseiros, privados de luz, malévolos, e são mais envenenadas por eles, ao passo que as almas amantes ainda se tornam mais puras e mais amantes, por seu contato com os Espíritos bons e amantes.
Jacob adormecido, cheio de sentimentos piedosos, vê os anjos do Senhor chegarem até ele em multidão, e a sombria alma de Judas Iscariotes dá ao chefe dos Espíritos sombrios o direito, direi mesmo o poder, de penetrar na sombria atmosfera de sua natureza odienta. Os Espíritos radiosos são abundantes onde se encontra um Elíseo; legiões de Espíritos sombrios pululam entre as almas sombrias.
Meu bem amado, medita bem no que acabo de dizer-te. Encontrarás numerosas aplicações para isto nos livros bíblicos, que encerram verdades ainda intactas, assim como instruções da mais alta importância, concernentes às relações que existem entre os mortais e os imortais, entre o mundo material e o mundo dos Espíritos.
Não depende senão de ti encontrar-te sob a influência benéfica dos Espíritos amantes ou de afastá-los de ti; podes mantê-los junto a ti ou forçá-los a te deixar. Depende de ti tornar-me mais ou menos feliz.
Agora deves compreender que todo ser amante torna-se mais feliz quando encontra um ser tão amante quanto ele; que o mais feliz e o mais puro dos seres torna-se menos feliz quando encontra uma diminuição de amor naquele que ama; que o amor abre o coração ao amor, e que a ausência desse sentimento torna mais difícil, por vezes mesmo impossível, o acesso de toda comunicação íntima.
Se desejas tornar-me, a mim que já desfruto da felicidade suprema, ainda mais feliz, torna-te ainda melhor. Por isto, tu me tornarás mais radioso e poderás simpatizar com todas as naturezas radiosas e imortais. Elas se apressarão a vir para junto de ti; sua luz reunir-se-á à tua e a tua à deles; sua presença tornar-te-á mais puro, mais radiante, mais vivaz e, o que te parecerá difícil acreditar, mas não o é por isto menos positivo, por efeito de tua luz, aquela que radiará de ti, elas mesmas tomar-se-ão mais luminosas, mais vivazes, mais felizes de sua existência, e, por efeito de teu amor, ainda mais amantes.
Meu bem-amado, existem relações imperecíveis entre o que chamais de mundos visível e invisível; uma comunhão incessante entre os habitantes da Terra e os do Céu, que sabem amar; uma ação benéfica recíproca de cada um desses mundos sobre o outro.
Meditando e analisando esta ideia com cuidado, reconhecerás cada vez mais a sua verdade, a sua urgência e a sua santidade.
Não te esqueças, irmão da Terra: tu vives visivelmente num mundo que ainda é invisível para ti!
Não o esqueças! No mundo dos Espíritos amantes, alegrar-se-ão por teu crescimento em amor puro e desinteressado!
Achamo-nos junto a ti, quando nos julgas bem longe. Jamais um ser amante se acha só e isolado.
A luz do amor atravessa as trevas do mundo material, para entrar num mundo menos material.
Os Espírito amantes e luminosos acham-se sempre na vizinhança do amor e da luz.
Estas palavras do Cristo são literalmente verdadeiras: “Onde estiverem reunidos dois ou três em meu nome, aí estarei com eles.”
Também é indubitavelmente certo que podemos afligir o Espírito de Deus por nosso egoísmo, e alegrá-lo por nosso verdadeiro amor, conforme o profundo sentido destas palavras: O que ligardes na Terra será ligado no Céu; o que desligardes na Terra será também desligado no Céu. Desligais pelo egoísmo, ligais pela caridade, isto é, pelo amor. Vós vos aproximais e vos afastais de nós. Nada é mais claramente compreendido no Céu do que o amor dos que amam na Terra.
Nada é mais atraente para os Espíritos bem-aventurados pertencentes a todos os graus de perfeição, do que o amor dos filhos da Terra.
Vós, que ainda sois chamados mortais, pelo amor podeis fazer descer o Céu sobre a Terra.
Poderíeis entrar conosco, bem-aventurados, numa comunicação infinitamente mais íntima do que podeis supor, se vossas almas se abrissem à nossa influência pelos impulsos do coração.
Muitas vezes estou junto a ti, meu bem-amado! Gosto de me encontrar na tua esfera de luz.
Permite-me dirigir-te ainda algumas palavras de confiança.
Quando te aborreces, a luz que irradia de ti, no momento em que pensas nos que tu amas ou nos que sofrem, se obscurece e, então, sou forçado a afastar-me de ti, pois nenhum Espírito amante pode suportar as trevas da cólera. Ainda recentemente tive que deixar-te. Eu, por assim dizer, te perdi de vista e me dirigi para outro amigo, ou antes, a luz de seu amor me atraiu para si. Ele orava, derramando lágrimas por uma família benfeitora, momentaneamente caída na maior miséria e que ele não estava em condições de socorrer. Oh! Como seu corpo terrestre já me parecia luminoso; foi como se uma claridade deslumbrante o inundasse. Nosso Senhor aproximou-se dele e um raio de seu espírito caiu nessa luz. Que felicidade para mim poder mergulhar nessa auréola e, retemperado por essa luz, estar em estado de inspirar à sua alma a esperança de um socorro próximo! Pareceu-me ouvir uma voz do fundo de sua alma, dizer-lhe: “Nada temas! Crê! Desfrutarás a alegria de poder aliviar aqueles por quem acabas de pedir a Deus.” Ele se ergueu inundado de alegria depois da prece. No mesmo instante fui atraído para outro ser radioso, também em prece... Era a nobre alma de uma virgem que orava e dizia: “Senhor! Ensina-me a fazer o bem segundo a tua vontade.” Pude e ousei inspirar-lhe a seguinte ideia: “Não farei bem mandando a esse homem caridoso, que conheço, um pouco de dinheiro, para que o empregue, ainda hoje, em proveito de alguma família pobre?”
Ela apegou-se a esta ideia com uma alegria infantil; recebeu-a como se tivesse recebido um anjo descido do Céu. Essa alma piedosa e caritativa reuniu uma soma considerável; depois escreveu uma cartinha muito afetuosa, dirigida àquele por quem acabava de orar, e que a recebeu, assim como o dinheiro, apenas uma hora depois de sua prece, derramando lágrimas de alegria e cheio de um profundo reconhecimento a Deus!
Eu o segui desfrutando eu mesmo uma suprema felicidade e alegrando-me em sua luz. Ele chegou à porta da pobre família. “Deus terá tido piedade de nós?” perguntava a piedosa esposa a seu piedoso marido. ─ “Sim, ele terá piedade de nós, como nós tivemos tido piedade dos outros.” ─ Ouvindo essa resposta do marido, aquele que tinha orado encheu-se de alegria; abriu a porta e, sufocado por sua ternura, apenas pôde pronunciar estas palavras: “Sim ele terá piedade de vós, como vós mesmos tivestes piedade dos pobres; eis uma dádiva da misericórdia de Deus. O Senhor vê os justos e ouve as suas súplicas.”
Com que viva luz brilharam todos os assistentes, quando, depois de ter lido a cartinha, levantaram os olhos e os braços para o céu! Massas de Espíritos se apressaram a vir de todos os lados. Como nos alegramos! Como nos abraçamos!
Como todos louvamos a Deus e o bendizemos! Como todos nos tornamos mais perfeitos, mais amantes!
Tu brilhaste outra vez; eu pude e ousei chegar junto a ti; tu tinhas feito três coisas que me conferiam o direito de aproximar-me de ti e de te alegrar. Tinhas derramado lágrimas de vergonha por tua cólera; tinhas refletido, ficando seriamente enternecido pelos meios de poder dominar-te; sinceramente tinhas pedido perdão àquele a quem o teu comportamento havia ofendido e buscavas de que maneira poderias compensá-lo, proporcionando-lhe alguma satisfação. Essa preocupação restituiu a calma ao teu coração, a alegria aos teus olhos, a luz ao teu corpo.
Por este exemplo podes julgar se estamos sempre bem instruídos do que fazem os amigos que deixamos na Terra, e quanto nos interessamos por seu estado moral. Agora também deves compreender a solidariedade que existe entre o mundo visível e o mundo invisível, e que de vós depende proporcionar-nos alegrias ou aflições.
Oh! meu bem-amado, se pudesses compenetrar-te desta grande verdade, que um amor nobre e puro encontra em si mesmo sua mais bela recompensa; que os mais puros gozos, o gozo de Deus, não são senão o produto de um sentimento mais depurado, apressar-te-ias em te depurares de tudo o que é egoísmo.
De agora em diante, jamais poderei escrever-te sem voltar a este assunto. Nada tem preço sem o amor. Só ele possui o golpe de vista claro, justo, penetrante, para distinguir o que merece ser estudado, o que é eminentemente verdadeiro, divino, imperecível. Em cada ser mortal e imortal animado de um amor puro nós vemos, com um inexprimível sentimento de prazer, refletir-se o próprio Deus, como vedes o sol brilhar em cada gota de água pura. Todos os que amam, na Terra como no Céu, não fazem senão um pelo sentimento. É do grau do amor que depende o grau de nossa perfeição, é de nossa felicidade interior e exterior. É teu amor que regula tuas relações com os Espíritos que deixaram a Terra, tua comunicação com eles, a influência que podem exercer sobre ti e sua ligação íntima com o teu Espírito.
Escrevendo-te isto, um sentimento de previsão que jamais me engana, ensiname que tu te achas neste momento em excelente disposição moral, porquanto pensas numa obra de caridade. Cada uma de vossas ações, de vossos pensamentos, leva um cunho particular, instantaneamente compreendido e apreciado por todos os Espíritos desencarnados. Que Deus venha em teu auxílio.
Escrevi isto a 16 de dezembro de 1798.
Seria supérfluo ressaltar a importância destas cartas de Lavater, que por toda parte excitaram o mais vivo interesse. Elas atestam, de sua parte, não só o conhecimento dos princípios fundamentais do Espiritismo, mas uma justa apreciação de suas consequências morais. Apenas sobre alguns pontos ele parece ter tido ideias um pouco diferentes do que hoje sabemos, mas a causa dessas divergências, que aliás talvez se devam mais à forma do que ao fundo, está explicada na comunicação seguinte, por ele dada na Sociedade de Paris. Nós não as levantaremos, porque cada um as terá compreendido; o essencial era constatar que, muito antes do aparecimento oficial do Espiritismo, homens cuja alta inteligência não poderia ser posta em dúvida, dele tiveram a intuição. Se não empregaram a palavra, é que ela não existia.
Contudo, chamaremos a atenção sobre um ponto que poderia parecer estranho. É a teoria segundo a qual a felicidade dos Espíritos estaria subordinada à pureza dos sentimentos dos encarnados e achar-se-ia alterada pela mais leve imperfeição destes. Se assim fosse, considerando o que são os homens, não haveria Espíritos realmente felizes, e a felicidade verdadeira não existiria no outro mundo, como não existe na Terra. Os Espíritos devem sofrer tanto menos os malefícios dos homens pelo fato de sabê-los perfectíveis. Os homens imperfeitos são para eles como crianças cuja educação não está concluída e na qual eles têm a missão de trabalhar, eles que igualmente passaram pela fieira da imperfeição. Mas se deixarmos de lado o que o princípio desenvolvido nesta carta pode ter de muito absoluto, não poderemos deixar de reconhecer um senso muito profundo, uma admirável penetração das leis que regem as relações do mundo visível e do mundo invisível, e das nuanças que caracterizam o grau de adiantamento dos Espíritos encarnados ou desencarnados.
Opinião atual de lavater sobre o Espiritismo
Comunicação verbal pelo Sr. Morin, em sonambulismo espontâneo
(Sociedade de Paris, 13 de março de 1868)
A partir do momento que a misericórdia divina permitiu que eu, humilde criatura, recebesse a revelação dos mensageiros da imensidade, até este dia, um a um os anos caíram no abismo dos tempos, e à medida que se escoavam, aumentavam também os conhecimentos dos homens e se alargava o seu horizonte intelectual.
Desde quando me foram dadas algumas das páginas que vos foram lidas, muitas outras foram dadas no mundo inteiro, sobre o mesmo assunto e pelo mesmo meio. Não creiais que eu tenha a pretensão, eu, humilde entre todos, de ter tido a honra insigne de ser o primeiro a receber tal favor. Não. Outros, antes de mim, também tinham recebido a revelação. Mas, como eu, ah! eles compreenderam incompletamente algumas de suas partes. É que é necessário, senhores, levar em conta o tempo, o grau de instrução moral, e sobretudo o grau de emancipação filosófica dos povos.
Os Espíritos, dos quais hoje me sinto feliz em fazer parte, formam, também eles, povos e mundos, mas eles não têm raças; eles estudam, eles veem, e seus estudos podem ser incontestavelmente maiores, mais vastos que os estudos dos homens; mas, não obstante, eles partem sempre dos conhecimentos adquiridos e do ponto culminante do progresso moral e intelectual do tempo e do meio em que vivem. Se os Espíritos, esses mensageiros divinos, vêm diariamente vos dar instruções de uma ordem mais elevada, é que a generalidade dos seres que as recebem está em condições de compreendê-las. Por força de preparações que sofreram, há instantes em que os homens não necessitam deixar passar sobre si a eternidade de um século para compreender. Desde que se vê elevar-se rapidamente o nível moral, uma espécie de atração os leva para uma certa corrente de ideias que eles devem assimilar, e para o objetivo a que devem aspirar. Mas esses instantes são curtos, e cabe aos homens aproveitá-los.
Eu disse que era preciso levar em conta os tempos e sobretudo o grau de emancipação filosófica que a época comportava. Reconhecido à Divindade, que me tinha permitido adquirir, por um favor especial, mais depressa do que outros homens que partiram do mesmo ponto, certos conhecimentos, recebi comunicações dos Espíritos. Mas a primeira educação, os ensinamentos estreitos, a tradição e o costume pesaram sobre mim; malgrado as minhas aspirações a adquirir uma liberdade, uma independência de espírito que eu desejava, amante atraído pelos Espíritos que vinham comunicar-se comigo, não conhecendo a ciência que vos foi revelada depois, eu não podia atrair senão os seres de ideias similares às minhas, às minhas aspirações, e que, com um horizonte mais largo, contudo tinham a mesma visão limitada. Daí, eu confesso, alguns erros que pudestes notar no que vos veio de mim; mas o fundo, o corpo principal não está, senhores, de acordo com tudo o que posteriormente vos foi revelado por esses mensageiros dos quais eu falava há pouco?
Espírito encarnado, por instinto levado ao bem, natureza fervorosa apoderandose de um pensamento que me levava ao verdadeiro, tão rápido, ah! como aquelas que me levavam ao erro, talvez aí esteja o motivo que provocou as inexatidões de minhas comunicações, sem ter, para retificá-las, o controle dos pontos de comparação. Porque, para que uma revelação seja perfeita, é preciso que se dirija a um homem perfeito, e este não existe; não é, pois, senão do conjunto que se podem extrair os elementos da verdade. Foi o que pudestes fazer; mas, em meu tempo, podia-se formar um conjunto de algumas parcelas do verdadeiro; de algumas comunicações excepcionais? Não. Sou feliz por ter sido um dos privilegiados do século passado; obtive algumas dessas comunicações por minha intermediação direta, e a maior parte por meio de um médium, meu amigo, completamente estranho à linguagem da alma, e é preciso dizer tudo, mesmo à do bem.
Feliz por partilhar essas ideias com inteligências que eu julgava acima da minha, uma porta me foi aberta; eu a aproveitei com entusiasmo, e todas as revelações da vida de além-túmulo foram por mim levadas ao conhecimento de uma Imperatriz que, por sua vez, as levou ao conhecimento do seu círculo, e assim por diante.
Acreditai que o Espiritismo não foi revelado espontaneamente; como todas as coisas saídas das mãos de Deus, ele desenvolveu-se progressivamente, lentamente, seguramente. Ele esteve em germe no primeiro germe das coisas, e cresceu com esse germe até que estivesse bastante forte para se subdividir ao infinito e espalhar por toda parte sua semente fecunda e regeneradora. É por ele que sereis felizes, que será assegurada a felicidade dos povos; que digo eu? a felicidade de todos os mundos, porque o Espiritismo, palavra que eu ignorava, é chamado a fazer revoluções muito grandes! Mas, tende a certeza, essas revoluções não ensanguentarão jamais a sua bandeira; são revoluções morais, intelectuais; revoluções gigantescas, mais irresistíveis que as provocadas pelas armas, pelas quais tudo é de tal modo chamado a se transformar, que tudo quanto conheceis não passa de fraco esboço do que elas produzirão. O Espiritismo é uma palavra tão vasta, tão grande, por tudo o que ela contém, que me parece que um homem que lhe pudesse conhecer toda a profundeza não poderia pronunciá-la sem respeito.
Senhores, eu, Espírito muito pequeno, a despeito da grande inteligência com que me gratificais, e em face daqueles muito superiores que me é dado contemplar, venho dizer-vos: Credes, então, que seja por efeito do acaso que esta noite pudestes ouvir o que Lavater tinha obtido e escrito? Não; não é por acaso que a minha mão perispiritual as dirigiu seguramente até vós. Mas se esses poucos pensamentos vieram ao vosso conhecimento por meu intermédio, não creiais que nisto eu tenha buscado uma vã satisfação do amor-próprio. Não, longe disto. O objetivo era maior, e nem mesmo me tinha vindo o pensamento de levá-las ao conhecimento universal da Terra. Esse conhecimento tinha a sua utilidade; ele deve ter consequências graves, e é por isto que vos foi dado espalhá-lo. Nas menores coisas encontra-se o germe das maiores renovações. Estou feliz, senhores, por ter sido deixado a mim o direito de vos pressagiar o alcance que terão essas poucas reflexões, essas comunicações, muito pobres ao lado das que obtendes atualmente; e se entrevejo o seu resultado, se me sinto feliz por isto, por que não vos sentiríeis?
Eu voltarei, senhores, e o que eu disse esta noite é tão pouco em comparação com o que tenho por missão vos ensinar, que ouso apenas dizer-vos: é Lavater.
Pergunta. ─ Agradecemos as explicações que tivestes a bondade de nos dar, e ficaremos muito contentes por contar convosco, de agora em diante, no número de nossos Espíritos instrutores. Receberemos vossas instruções com o mais vivo reconhecimento. Enquanto esperamos, permiti uma simples pergunta sobre a vossa comunicação de hoje:
1º ─ Dissestes que a Imperatriz levou essas ideias ao conhecimento de seu círculo, e assim por diante. Seria por esta iniciativa, partida do ponto culminante da Sociedade, que a Doutrina Espírita deve encontrar tão numerosas simpatias entre as sumidades sociais na Rússia?
2º ─ Um ponto que me admiro não ver mencionado em vossas cartas, é o grande princípio da reencarnação, uma das leis naturais que mais testemunham a justiça e a bondade de Deus.
Resposta. ─ É evidente que a influência da Imperatriz e de alguns outros grandes personagens foi predominante para determinar, na Rússia, o desenvolvimento do movimento filosófico no sentido espiritualista, mas se o pensamento dos príncipes da Terra por vezes determina o pensamento dos grandes que se acham em sua dependência, já o mesmo não se dá com os pequenos. Os que têm chance de desenvolver no povo as ideias progressistas são os filhos do povo; são eles que farão triunfar, por toda parte, os princípios da solidariedade e da caridade, que são a base do Espiritismo.
Assim, em sua sabedoria, Deus escalonou os elementos do progresso: Eles estão no alto, embaixo, sob todas as formas, e preparados para combater todas as resistências. Eles sofrem, assim, um movimento de vai e vem constante, que não pode deixar de estabelecer a harmonia dos sentimentos entre as altas e as baixas classes, e fazer triunfar solidariamente os princípios de autoridade e de liberdade.
Como sabeis, os povos são formados de Espíritos que têm entre si uma afinidade de ideias, que os predispõem, mais ou menos, para assimilar as ideias desta ou daquela ordem, porque essas mesmas ideias neles estão em estado latente e não esperam senão uma ocasião para se desenvolverem. O povo russo e vários outros estão neste caso em relação ao Espiritismo. Por pouco que o movimento fosse secundado, em vez de ser entravado, não se passariam dez anos antes que todos os indivíduos, sem exceção, fossem espíritas. Mas esses mesmos entraves são úteis para temperar o movimento que, embora um pouco desacelerado, não deixa de ser mais refletido. A Onipotência, por cuja vontade tudo se realiza, saberá muito bem como remover os obstáculos quando for tempo. Um dia o Espiritismo será a fé universal, e admirar-se-ão de que não tenha sido sempre assim.
Quanto ao princípio da reencarnação terrestre, confesso-vos que a minha iniciação não tinha chegado até lá, e sem dúvida de propósito, porque eu não teria deixado de fazer, como das outras revelações, o assunto de minhas instruções à Imperatriz, e talvez isto tivesse sido prematuro. Os que presidem o movimento ascensional sabem muito bem o que fazem. Os princípios nascem um a um, conforme os tempos, os lugares e os indivíduos, e estava reservado à vossa época vê-los reunidos em um feixe sólido, lógico e inatacável.
LAVATER.
Desde quando me foram dadas algumas das páginas que vos foram lidas, muitas outras foram dadas no mundo inteiro, sobre o mesmo assunto e pelo mesmo meio. Não creiais que eu tenha a pretensão, eu, humilde entre todos, de ter tido a honra insigne de ser o primeiro a receber tal favor. Não. Outros, antes de mim, também tinham recebido a revelação. Mas, como eu, ah! eles compreenderam incompletamente algumas de suas partes. É que é necessário, senhores, levar em conta o tempo, o grau de instrução moral, e sobretudo o grau de emancipação filosófica dos povos.
Os Espíritos, dos quais hoje me sinto feliz em fazer parte, formam, também eles, povos e mundos, mas eles não têm raças; eles estudam, eles veem, e seus estudos podem ser incontestavelmente maiores, mais vastos que os estudos dos homens; mas, não obstante, eles partem sempre dos conhecimentos adquiridos e do ponto culminante do progresso moral e intelectual do tempo e do meio em que vivem. Se os Espíritos, esses mensageiros divinos, vêm diariamente vos dar instruções de uma ordem mais elevada, é que a generalidade dos seres que as recebem está em condições de compreendê-las. Por força de preparações que sofreram, há instantes em que os homens não necessitam deixar passar sobre si a eternidade de um século para compreender. Desde que se vê elevar-se rapidamente o nível moral, uma espécie de atração os leva para uma certa corrente de ideias que eles devem assimilar, e para o objetivo a que devem aspirar. Mas esses instantes são curtos, e cabe aos homens aproveitá-los.
Eu disse que era preciso levar em conta os tempos e sobretudo o grau de emancipação filosófica que a época comportava. Reconhecido à Divindade, que me tinha permitido adquirir, por um favor especial, mais depressa do que outros homens que partiram do mesmo ponto, certos conhecimentos, recebi comunicações dos Espíritos. Mas a primeira educação, os ensinamentos estreitos, a tradição e o costume pesaram sobre mim; malgrado as minhas aspirações a adquirir uma liberdade, uma independência de espírito que eu desejava, amante atraído pelos Espíritos que vinham comunicar-se comigo, não conhecendo a ciência que vos foi revelada depois, eu não podia atrair senão os seres de ideias similares às minhas, às minhas aspirações, e que, com um horizonte mais largo, contudo tinham a mesma visão limitada. Daí, eu confesso, alguns erros que pudestes notar no que vos veio de mim; mas o fundo, o corpo principal não está, senhores, de acordo com tudo o que posteriormente vos foi revelado por esses mensageiros dos quais eu falava há pouco?
Espírito encarnado, por instinto levado ao bem, natureza fervorosa apoderandose de um pensamento que me levava ao verdadeiro, tão rápido, ah! como aquelas que me levavam ao erro, talvez aí esteja o motivo que provocou as inexatidões de minhas comunicações, sem ter, para retificá-las, o controle dos pontos de comparação. Porque, para que uma revelação seja perfeita, é preciso que se dirija a um homem perfeito, e este não existe; não é, pois, senão do conjunto que se podem extrair os elementos da verdade. Foi o que pudestes fazer; mas, em meu tempo, podia-se formar um conjunto de algumas parcelas do verdadeiro; de algumas comunicações excepcionais? Não. Sou feliz por ter sido um dos privilegiados do século passado; obtive algumas dessas comunicações por minha intermediação direta, e a maior parte por meio de um médium, meu amigo, completamente estranho à linguagem da alma, e é preciso dizer tudo, mesmo à do bem.
Feliz por partilhar essas ideias com inteligências que eu julgava acima da minha, uma porta me foi aberta; eu a aproveitei com entusiasmo, e todas as revelações da vida de além-túmulo foram por mim levadas ao conhecimento de uma Imperatriz que, por sua vez, as levou ao conhecimento do seu círculo, e assim por diante.
Acreditai que o Espiritismo não foi revelado espontaneamente; como todas as coisas saídas das mãos de Deus, ele desenvolveu-se progressivamente, lentamente, seguramente. Ele esteve em germe no primeiro germe das coisas, e cresceu com esse germe até que estivesse bastante forte para se subdividir ao infinito e espalhar por toda parte sua semente fecunda e regeneradora. É por ele que sereis felizes, que será assegurada a felicidade dos povos; que digo eu? a felicidade de todos os mundos, porque o Espiritismo, palavra que eu ignorava, é chamado a fazer revoluções muito grandes! Mas, tende a certeza, essas revoluções não ensanguentarão jamais a sua bandeira; são revoluções morais, intelectuais; revoluções gigantescas, mais irresistíveis que as provocadas pelas armas, pelas quais tudo é de tal modo chamado a se transformar, que tudo quanto conheceis não passa de fraco esboço do que elas produzirão. O Espiritismo é uma palavra tão vasta, tão grande, por tudo o que ela contém, que me parece que um homem que lhe pudesse conhecer toda a profundeza não poderia pronunciá-la sem respeito.
Senhores, eu, Espírito muito pequeno, a despeito da grande inteligência com que me gratificais, e em face daqueles muito superiores que me é dado contemplar, venho dizer-vos: Credes, então, que seja por efeito do acaso que esta noite pudestes ouvir o que Lavater tinha obtido e escrito? Não; não é por acaso que a minha mão perispiritual as dirigiu seguramente até vós. Mas se esses poucos pensamentos vieram ao vosso conhecimento por meu intermédio, não creiais que nisto eu tenha buscado uma vã satisfação do amor-próprio. Não, longe disto. O objetivo era maior, e nem mesmo me tinha vindo o pensamento de levá-las ao conhecimento universal da Terra. Esse conhecimento tinha a sua utilidade; ele deve ter consequências graves, e é por isto que vos foi dado espalhá-lo. Nas menores coisas encontra-se o germe das maiores renovações. Estou feliz, senhores, por ter sido deixado a mim o direito de vos pressagiar o alcance que terão essas poucas reflexões, essas comunicações, muito pobres ao lado das que obtendes atualmente; e se entrevejo o seu resultado, se me sinto feliz por isto, por que não vos sentiríeis?
Eu voltarei, senhores, e o que eu disse esta noite é tão pouco em comparação com o que tenho por missão vos ensinar, que ouso apenas dizer-vos: é Lavater.
Pergunta. ─ Agradecemos as explicações que tivestes a bondade de nos dar, e ficaremos muito contentes por contar convosco, de agora em diante, no número de nossos Espíritos instrutores. Receberemos vossas instruções com o mais vivo reconhecimento. Enquanto esperamos, permiti uma simples pergunta sobre a vossa comunicação de hoje:
1º ─ Dissestes que a Imperatriz levou essas ideias ao conhecimento de seu círculo, e assim por diante. Seria por esta iniciativa, partida do ponto culminante da Sociedade, que a Doutrina Espírita deve encontrar tão numerosas simpatias entre as sumidades sociais na Rússia?
2º ─ Um ponto que me admiro não ver mencionado em vossas cartas, é o grande princípio da reencarnação, uma das leis naturais que mais testemunham a justiça e a bondade de Deus.
Resposta. ─ É evidente que a influência da Imperatriz e de alguns outros grandes personagens foi predominante para determinar, na Rússia, o desenvolvimento do movimento filosófico no sentido espiritualista, mas se o pensamento dos príncipes da Terra por vezes determina o pensamento dos grandes que se acham em sua dependência, já o mesmo não se dá com os pequenos. Os que têm chance de desenvolver no povo as ideias progressistas são os filhos do povo; são eles que farão triunfar, por toda parte, os princípios da solidariedade e da caridade, que são a base do Espiritismo.
Assim, em sua sabedoria, Deus escalonou os elementos do progresso: Eles estão no alto, embaixo, sob todas as formas, e preparados para combater todas as resistências. Eles sofrem, assim, um movimento de vai e vem constante, que não pode deixar de estabelecer a harmonia dos sentimentos entre as altas e as baixas classes, e fazer triunfar solidariamente os princípios de autoridade e de liberdade.
Como sabeis, os povos são formados de Espíritos que têm entre si uma afinidade de ideias, que os predispõem, mais ou menos, para assimilar as ideias desta ou daquela ordem, porque essas mesmas ideias neles estão em estado latente e não esperam senão uma ocasião para se desenvolverem. O povo russo e vários outros estão neste caso em relação ao Espiritismo. Por pouco que o movimento fosse secundado, em vez de ser entravado, não se passariam dez anos antes que todos os indivíduos, sem exceção, fossem espíritas. Mas esses mesmos entraves são úteis para temperar o movimento que, embora um pouco desacelerado, não deixa de ser mais refletido. A Onipotência, por cuja vontade tudo se realiza, saberá muito bem como remover os obstáculos quando for tempo. Um dia o Espiritismo será a fé universal, e admirar-se-ão de que não tenha sido sempre assim.
Quanto ao princípio da reencarnação terrestre, confesso-vos que a minha iniciação não tinha chegado até lá, e sem dúvida de propósito, porque eu não teria deixado de fazer, como das outras revelações, o assunto de minhas instruções à Imperatriz, e talvez isto tivesse sido prematuro. Os que presidem o movimento ascensional sabem muito bem o que fazem. Os princípios nascem um a um, conforme os tempos, os lugares e os indivíduos, e estava reservado à vossa época vê-los reunidos em um feixe sólido, lógico e inatacável.
LAVATER.
Educação de além-túmulo
Escrevem-nos de Caen:
Uma senhora e suas três filhas, querendo estudar a Doutrina Espírita, não podiam ler duas páginas sem sentir um mal-estar que elas não entendiam. Um dia encontrei-me em casa dessas senhoras, com uma jovem médium sonâmbula muito lúcida. Esta adormeceu espontaneamente e viu perto de si um Espírito que reconheceu como o padre L..., antigo cura do lugar, falecido há uns dez anos.
“Pergunta: ─ Sois vós, senhor, o cura, que impedis esta família de ler?
“Resposta: ─ Sim, sou eu. Velo incessantemente sobre o rebanho confiado aos meus cuidados. Há muito tempo que vos vejo querer instruir minhas penitentes em vossa triste doutrina. Quem vos deu o direito de ensinar? Fizestes estudos para isto?
“─ Dizei-nos, senhor padre, estais no Céu?
“─ Não. Não sou bastante puro para ver a Deus.
“─ Então estais nas chamas do purgatório?
“─ Não, pois não sofro.
“─ Vistes o inferno?
“─ Fazeis-me tremer! Vós me perturbais! Não vos posso responder, porque talvez me digais que devo estar numa destas três coisas. Tremo ao pensar no que dizeis, contudo sou atraído para vós pela lógica de vossos raciocínios. Voltarei e discutirei convosco.
“Com efeito, ele voltou muitas vezes. Discutimos e ele compreendeu tão bem que foi tomado de entusiasmo. Ultimamente ele exclamava: “Sim, agora sou espírita, dizei-o a todos os que ensinam. Ah! Como eu gostaria que eles compreendessem Deus como este anjo mo fez conhecer!” Ele falava de Cárita, que tinha vindo a nós e diante da qual ele caiu de joelhos, dizendo que não era um Espírito, mas um anjo. A partir desse momento ele tomou por missão instruir os que pretendem instruir os outros.”
Nosso correspondente acrescenta o seguinte fato:
“Entre os Espíritos que vêm ao nosso círculo, temos tido o Dr. X..., que se apodera do nosso médium, e que é como uma criança. É preciso dar-lhe explicações sobre tudo. Ele avança, compreende e está cheio de entusiasmo; vai junto dos cientistas que conheceu; quer explicar-lhes o que vê, o que ele agora sabe, mas eles não o compreendem; então ele se irrita e os trata de ignaros.
Um dia, numa reunião de dez pessoas, ele se apoderou da menina, como de hábito (a mocinha médium, pela qual ele falava e agia); perguntou-me quem era eu e por que sabia tanto sem nada ter aprendido; tomou-me a cabeça com as mãos e disse: “Eis a matéria, aí me reconheço, mas como estou eu aqui? Como posso fazer falar este organismo que, entretanto, não é meu? Falais-me da alma, mas onde está a que habita este corpo?”
“Depois de lhe haver feito notar o laço fluídico que une o Espírito ao corpo durante a vida, ele exclamou de repente, falando da mocinha médium: “Conheço esta menina; eu a vi em minha casa; tinha o coração doente. Como é que não mais está? Dizei-me, quem a curou?” Fiz-lhe ver que se enganava e que jamais a tinha visto ─ “Não, disse ele, não me engano, e a prova é que lhe piquei o braço e ela não sentiu nenhuma dor.”
“Quando a jovem foi despertada, perguntamos se tinha conhecido o doutor e se tinha ido consultá-lo. ‘Não sei se foi ele, respondeu ela, mas estando em Paris, levaram-me a um célebre médico, do qual não me lembro o nome nem do endereço.’
“Suas ideias se modificam rapidamente; é agora um Espírito no delírio da felicidade do que ele sabe; ele queria provar a todo mundo que o nosso ensino é incontestável. O que sobretudo o preocupa é a questão dos fluidos. ‘Eu quero, diz ele, curar como o vosso amigo; não quero mais servir-me de venenos; não os tomeis nunca.’ Hoje ele estuda o homem, não mais no seu organismo, mas na sua alma; feznos dizer como se operava a união da alma com o corpo na concepção, o que pareceu deixá-lo feliz. O bom Dr. Demeure veio em seguida e nos disse que não nos admirássemos com as perguntas, por vezes pueris, que ele nos poderia fazer. E disse: ‘Ele é como a criança a quem se deve ensinar a ler no grande livro da Natureza; mas como é ao mesmo tempo uma grande inteligência, instrui-se rapidamente, e nós para isso concorremos do nosso lado.’”
Estes dois exemplos vêm confirmar estes três grandes princípios revelados pelo Espiritismo, a saber:
1º ─ Que a alma conserva no mundo dos Espíritos, por um tempo mais ou menos longo, as ideias e preconceitos que tinha na vida terrestre;
2º ─ Que ela se modifica, progride e adquire novos conhecimentos no mundo dos Espíritos;
3º ─ Que os encarnados podem contribuir para o progresso dos Espíritos desencarnados.
Estes princípios, resultado de inumeráveis observações, têm uma importância capital, porque derrubam todas as ideias implantadas pelas crenças religiosas sobre o estado estacionário e definitivo dos Espíritos após a morte. Desde que é demonstrado o progresso no estado espiritual, todas as crenças fundadas na perpetuidade de uma situação uniforme qualquer caem ante a autoridade dos fatos. Elas também caem ante a razão filosófica que diz que o progresso é uma lei da Natureza, e que o estado estacionário dos Espíritos seria, ao mesmo tempo, a negação dessa lei e da justiça de Deus.
Progredindo o Espírito fora da encarnação, disso resulta esta outra consequência não menos capital: Voltando à Terra, ele traz o duplo adquirido das existências anteriores e da erraticidade. Assim se realiza o progresso das gerações.
É incontestável que quando o médico e o padre do qual se falou acima renascerem, eles trarão ideias e opiniões completamente diversas das que tinham na existência que acabam de deixar; um não será mais fanático, o outro não será mais materialista, e ambos serão espíritas. Outro tanto pode-se dizer do Dr. Morel Lavallé, do bispo de Barcelona e de tantos outros. Há, pois, utilidade, para o futuro da Sociedade, em se ocupar da educação dos Espíritos.
Uma senhora e suas três filhas, querendo estudar a Doutrina Espírita, não podiam ler duas páginas sem sentir um mal-estar que elas não entendiam. Um dia encontrei-me em casa dessas senhoras, com uma jovem médium sonâmbula muito lúcida. Esta adormeceu espontaneamente e viu perto de si um Espírito que reconheceu como o padre L..., antigo cura do lugar, falecido há uns dez anos.
“Pergunta: ─ Sois vós, senhor, o cura, que impedis esta família de ler?
“Resposta: ─ Sim, sou eu. Velo incessantemente sobre o rebanho confiado aos meus cuidados. Há muito tempo que vos vejo querer instruir minhas penitentes em vossa triste doutrina. Quem vos deu o direito de ensinar? Fizestes estudos para isto?
“─ Dizei-nos, senhor padre, estais no Céu?
“─ Não. Não sou bastante puro para ver a Deus.
“─ Então estais nas chamas do purgatório?
“─ Não, pois não sofro.
“─ Vistes o inferno?
“─ Fazeis-me tremer! Vós me perturbais! Não vos posso responder, porque talvez me digais que devo estar numa destas três coisas. Tremo ao pensar no que dizeis, contudo sou atraído para vós pela lógica de vossos raciocínios. Voltarei e discutirei convosco.
“Com efeito, ele voltou muitas vezes. Discutimos e ele compreendeu tão bem que foi tomado de entusiasmo. Ultimamente ele exclamava: “Sim, agora sou espírita, dizei-o a todos os que ensinam. Ah! Como eu gostaria que eles compreendessem Deus como este anjo mo fez conhecer!” Ele falava de Cárita, que tinha vindo a nós e diante da qual ele caiu de joelhos, dizendo que não era um Espírito, mas um anjo. A partir desse momento ele tomou por missão instruir os que pretendem instruir os outros.”
Nosso correspondente acrescenta o seguinte fato:
“Entre os Espíritos que vêm ao nosso círculo, temos tido o Dr. X..., que se apodera do nosso médium, e que é como uma criança. É preciso dar-lhe explicações sobre tudo. Ele avança, compreende e está cheio de entusiasmo; vai junto dos cientistas que conheceu; quer explicar-lhes o que vê, o que ele agora sabe, mas eles não o compreendem; então ele se irrita e os trata de ignaros.
Um dia, numa reunião de dez pessoas, ele se apoderou da menina, como de hábito (a mocinha médium, pela qual ele falava e agia); perguntou-me quem era eu e por que sabia tanto sem nada ter aprendido; tomou-me a cabeça com as mãos e disse: “Eis a matéria, aí me reconheço, mas como estou eu aqui? Como posso fazer falar este organismo que, entretanto, não é meu? Falais-me da alma, mas onde está a que habita este corpo?”
“Depois de lhe haver feito notar o laço fluídico que une o Espírito ao corpo durante a vida, ele exclamou de repente, falando da mocinha médium: “Conheço esta menina; eu a vi em minha casa; tinha o coração doente. Como é que não mais está? Dizei-me, quem a curou?” Fiz-lhe ver que se enganava e que jamais a tinha visto ─ “Não, disse ele, não me engano, e a prova é que lhe piquei o braço e ela não sentiu nenhuma dor.”
“Quando a jovem foi despertada, perguntamos se tinha conhecido o doutor e se tinha ido consultá-lo. ‘Não sei se foi ele, respondeu ela, mas estando em Paris, levaram-me a um célebre médico, do qual não me lembro o nome nem do endereço.’
“Suas ideias se modificam rapidamente; é agora um Espírito no delírio da felicidade do que ele sabe; ele queria provar a todo mundo que o nosso ensino é incontestável. O que sobretudo o preocupa é a questão dos fluidos. ‘Eu quero, diz ele, curar como o vosso amigo; não quero mais servir-me de venenos; não os tomeis nunca.’ Hoje ele estuda o homem, não mais no seu organismo, mas na sua alma; feznos dizer como se operava a união da alma com o corpo na concepção, o que pareceu deixá-lo feliz. O bom Dr. Demeure veio em seguida e nos disse que não nos admirássemos com as perguntas, por vezes pueris, que ele nos poderia fazer. E disse: ‘Ele é como a criança a quem se deve ensinar a ler no grande livro da Natureza; mas como é ao mesmo tempo uma grande inteligência, instrui-se rapidamente, e nós para isso concorremos do nosso lado.’”
Estes dois exemplos vêm confirmar estes três grandes princípios revelados pelo Espiritismo, a saber:
1º ─ Que a alma conserva no mundo dos Espíritos, por um tempo mais ou menos longo, as ideias e preconceitos que tinha na vida terrestre;
2º ─ Que ela se modifica, progride e adquire novos conhecimentos no mundo dos Espíritos;
3º ─ Que os encarnados podem contribuir para o progresso dos Espíritos desencarnados.
Estes princípios, resultado de inumeráveis observações, têm uma importância capital, porque derrubam todas as ideias implantadas pelas crenças religiosas sobre o estado estacionário e definitivo dos Espíritos após a morte. Desde que é demonstrado o progresso no estado espiritual, todas as crenças fundadas na perpetuidade de uma situação uniforme qualquer caem ante a autoridade dos fatos. Elas também caem ante a razão filosófica que diz que o progresso é uma lei da Natureza, e que o estado estacionário dos Espíritos seria, ao mesmo tempo, a negação dessa lei e da justiça de Deus.
Progredindo o Espírito fora da encarnação, disso resulta esta outra consequência não menos capital: Voltando à Terra, ele traz o duplo adquirido das existências anteriores e da erraticidade. Assim se realiza o progresso das gerações.
É incontestável que quando o médico e o padre do qual se falou acima renascerem, eles trarão ideias e opiniões completamente diversas das que tinham na existência que acabam de deixar; um não será mais fanático, o outro não será mais materialista, e ambos serão espíritas. Outro tanto pode-se dizer do Dr. Morel Lavallé, do bispo de Barcelona e de tantos outros. Há, pois, utilidade, para o futuro da Sociedade, em se ocupar da educação dos Espíritos.
O Doutor Philippineau
Impressões de um médico materialista no mundo dos Espíritos
Impressões de um médico materialista no mundo dos Espíritos Numa reunião íntima de família, em que se ocupavam de comunicações pela tiptologia, dois Espíritos conversavam, manifestando-se espontaneamente, sem nenhuma evocação prévia, e sem que pensassem neles. Um era o de um médico distinto, que designaremos pelo nome de Philippeau, falecido há pouco, e que em vida tinha feito abertamente profissão do mais absoluto materialismo; o outro era o de uma mulher que assinou Santa Vitória. É essa conversa que relatamos a seguir. É digno de nota que as pessoas que obtiveram essa manifestação não conheciam o médico senão por sua reputação, mas não tinham qualquer ideia de seu caráter, de seus hábitos nem de suas opiniões; assim, a comunicação de modo algum poderia ser o reflexo do pensamento delas, principalmente porque ela foi obtida pela tiptologia, portanto era inteiramente inconsciente.
Perguntas do médico: O Espiritismo me ensina que é preciso esperar, amar, perdoar; eu faria tudo isto se soubesse como começar. É preciso esperar, o quê? É preciso perdoar o que e a quem? É preciso amar, a quem? Respondei-me.
PHILIPPEAU.
Resposta: É preciso esperar da misericórdia de Deus, que é infinita. É preciso perdoar aos que vos ofenderam. É preciso amar ao próximo como a si mesmo. É preciso amar a Deus, a fim de que Deus vos ame e vos perdoe. É preciso orar e lhe render graças por todas as suas bondades, por todas as vossas misérias, porque miséria e bondade, tudo nos vem dele, isto é, tudo nos vem dele conforme o que tenhamos merecido.
Aquele que expiou, mais tarde terá a sua recompensa. Cada coisa tem a sua razão de ser, e Deus, que é soberanamente bom e justo, dá a cada um segundo as suas obras. Amar e orar, eis toda a vida, toda a eternidade.
SANTA VITÓRIA.
O médico: Eu queria, de toda a minha alma, vos satisfazer, senhora, mas temo muito não poder fazê-lo inteiramente; contudo, vou tentar.
Uma vez morto, materialmente falando, eu pensava que tudo estivesse acabado; então, quando minha matéria ficou inerte, fui tomado de espanto, ao me sentir ainda vivo.
Vi esses homens a me carregar e disse de mim para mim: Mas eu não estou morto! Então esses médicos imbecis não veem que eu vivo, que eu respiro, que eu ando, que eu os vejo, que eu os sigo, a eles que vêm ao meu enterro?... A quem é então que enterram?... Esse não sou eu... Eu escutava uns e outros dizerem: “Esse pobre Philippeau fez muitas curas; ele matou alguns; hoje é a sua vez; quando a morte chega nós perdemos o nosso tempo.” Por mais que eu gritasse: ─ Mas Philippeau não morre assim; não estou morto!” não me escutavam, não me viam.
Assim se passaram três dias; eu estava desaparecido do mundo, e eu me sentia mais vivo do que nunca. Seja acaso, seja a providência, meus olhos caíram sobre uma brochura de Allan Kardec; li suas descrições sobre o Espiritismo, e me disse: Seria eu, por acaso, um Espírito?... Li, reli e então compreendi a transformação de meu ser; eu não era mais um homem, mas um Espírito!... Sim, mas então, o que eu tinha que fazer nesse mundo novo, nessa nova esfera?... Eu vagava, procurava. Encontrei o vazio, o sombrio, o abismo, enfim.
O que tinha feito eu, ao deixar o mundo, para vir habitar estas trevas?... Então o inferno é negro e foi nesse inferno que eu caí?... Por quê?... Porque trabalhei toda a minha vida? Porque empreguei minha vida a cuidar de uns e de outros, a salvá-los quando minha ciência o permitia?... Não! Não!... Por que, então? Por quê?... Procuro! Procuro!... Nada; não encontro nada.
Então reli Allan Kardec: esperar, perdoar e amar, eis a solução. Agora compreendo o resto; o que não tinha compreendido, o que eu tinha negado: Deus, o Ser invisível e supremo; é preciso que lhe peça; o que eu tinha feito para a Ciência, era preciso fazer para Deus; que eu estude, que realize minha missão espiritual. Compreendo essas coisas ainda vagamente e vejo longos combates em minha mente, porque todo um mundo novo se abre para mim e recuo apavorado ante o que tenho a percorrer. Entretanto, dizeis que é preciso expiar; essa Terra me foi muito penosa, pois me foi necessário mais sofrimento do que podeis imaginar para chegar onde cheguei! A ambição era o meu único móvel; eu queria, e consegui.
Agora tudo está para refazer. Fiz tudo ao contrário do que devia. Eu aprendi, me aprofundei na ciência, não por amor à ciência, mas por ambição, para ser mais que os outros, para que falassem de mim. Tratei do próximo, não para o aliviar, mas para me enriquecer. Numa palavra, dediquei-me inteiramente à matéria, quando se deve dedicar ao espírito. Quais são hoje as minhas obras? A riqueza, a ciência; nada! nada! Tudo está para refazer.
Terei coragem para isto? Terei a força, os meios, a facilidade?... O mundo espiritual em que marcho é um enigma; a prece me é desconhecida. Que fazer? Quem me ajudará? Talvez vós, que já me respondestes... Cuidado! A tarefa é rude, difícil, o aprendiz às vezes rebelde... Contudo procurarei render-me às vossas boas razões, e, de antemão, agradeço a vossa bondade.
PHILIPPEAU.
Perguntas do médico: O Espiritismo me ensina que é preciso esperar, amar, perdoar; eu faria tudo isto se soubesse como começar. É preciso esperar, o quê? É preciso perdoar o que e a quem? É preciso amar, a quem? Respondei-me.
PHILIPPEAU.
Resposta: É preciso esperar da misericórdia de Deus, que é infinita. É preciso perdoar aos que vos ofenderam. É preciso amar ao próximo como a si mesmo. É preciso amar a Deus, a fim de que Deus vos ame e vos perdoe. É preciso orar e lhe render graças por todas as suas bondades, por todas as vossas misérias, porque miséria e bondade, tudo nos vem dele, isto é, tudo nos vem dele conforme o que tenhamos merecido.
Aquele que expiou, mais tarde terá a sua recompensa. Cada coisa tem a sua razão de ser, e Deus, que é soberanamente bom e justo, dá a cada um segundo as suas obras. Amar e orar, eis toda a vida, toda a eternidade.
SANTA VITÓRIA.
O médico: Eu queria, de toda a minha alma, vos satisfazer, senhora, mas temo muito não poder fazê-lo inteiramente; contudo, vou tentar.
Uma vez morto, materialmente falando, eu pensava que tudo estivesse acabado; então, quando minha matéria ficou inerte, fui tomado de espanto, ao me sentir ainda vivo.
Vi esses homens a me carregar e disse de mim para mim: Mas eu não estou morto! Então esses médicos imbecis não veem que eu vivo, que eu respiro, que eu ando, que eu os vejo, que eu os sigo, a eles que vêm ao meu enterro?... A quem é então que enterram?... Esse não sou eu... Eu escutava uns e outros dizerem: “Esse pobre Philippeau fez muitas curas; ele matou alguns; hoje é a sua vez; quando a morte chega nós perdemos o nosso tempo.” Por mais que eu gritasse: ─ Mas Philippeau não morre assim; não estou morto!” não me escutavam, não me viam.
Assim se passaram três dias; eu estava desaparecido do mundo, e eu me sentia mais vivo do que nunca. Seja acaso, seja a providência, meus olhos caíram sobre uma brochura de Allan Kardec; li suas descrições sobre o Espiritismo, e me disse: Seria eu, por acaso, um Espírito?... Li, reli e então compreendi a transformação de meu ser; eu não era mais um homem, mas um Espírito!... Sim, mas então, o que eu tinha que fazer nesse mundo novo, nessa nova esfera?... Eu vagava, procurava. Encontrei o vazio, o sombrio, o abismo, enfim.
O que tinha feito eu, ao deixar o mundo, para vir habitar estas trevas?... Então o inferno é negro e foi nesse inferno que eu caí?... Por quê?... Porque trabalhei toda a minha vida? Porque empreguei minha vida a cuidar de uns e de outros, a salvá-los quando minha ciência o permitia?... Não! Não!... Por que, então? Por quê?... Procuro! Procuro!... Nada; não encontro nada.
Então reli Allan Kardec: esperar, perdoar e amar, eis a solução. Agora compreendo o resto; o que não tinha compreendido, o que eu tinha negado: Deus, o Ser invisível e supremo; é preciso que lhe peça; o que eu tinha feito para a Ciência, era preciso fazer para Deus; que eu estude, que realize minha missão espiritual. Compreendo essas coisas ainda vagamente e vejo longos combates em minha mente, porque todo um mundo novo se abre para mim e recuo apavorado ante o que tenho a percorrer. Entretanto, dizeis que é preciso expiar; essa Terra me foi muito penosa, pois me foi necessário mais sofrimento do que podeis imaginar para chegar onde cheguei! A ambição era o meu único móvel; eu queria, e consegui.
Agora tudo está para refazer. Fiz tudo ao contrário do que devia. Eu aprendi, me aprofundei na ciência, não por amor à ciência, mas por ambição, para ser mais que os outros, para que falassem de mim. Tratei do próximo, não para o aliviar, mas para me enriquecer. Numa palavra, dediquei-me inteiramente à matéria, quando se deve dedicar ao espírito. Quais são hoje as minhas obras? A riqueza, a ciência; nada! nada! Tudo está para refazer.
Terei coragem para isto? Terei a força, os meios, a facilidade?... O mundo espiritual em que marcho é um enigma; a prece me é desconhecida. Que fazer? Quem me ajudará? Talvez vós, que já me respondestes... Cuidado! A tarefa é rude, difícil, o aprendiz às vezes rebelde... Contudo procurarei render-me às vossas boas razões, e, de antemão, agradeço a vossa bondade.
PHILIPPEAU.
O Espiritismo em toda a parte
A Condessa de Monte-Cristo
Sob este título, a Petite Presse publica um romance-folhetim, no qual se encontram as passagens seguintes, extraídas dos capítulos XXX e XXXI:
“Meu paraíso, querida mãe, dizia à Condessa de Monte Cristo a sua filha agonizante, será ficar junto a ti, perto de vós! sempre viva em vossos pensamentos, escutando-vos e vos respondendo, conversando baixinho com as vossas almas.
“Quando a flor embalsamar o jardim, e a levares aos teus lábios, estarei na flor e serei eu quem receberá o beijo! Também me farei o raio, o sopro que passa, o murmúrio que soa. O vento que agitar os teus cabelos será a minha carícia; o cheiro que dos lilases floridos se elevar para a tua janela será o meu hálito; o canto longínquo que te fará chorar será a minha voz.
. . . . . . . . . .
“─ Mãe, não blasfemes! Nada de cólera contra Deus! Vamos! Essas cóleras e essas blasfêmias nos separariam para sempre.
“Enquanto estiveres aqui embaixo, eu me farei tua companheira de exílio; mais tarde, porém, quando resignada às vontades do nosso Pai que está nos Céus, por tua vez terás fechado os olhos para não mais abri-los; então, por minha vez, estarei à tua cabeceira, esperando a tua libertação, e ébrios de uma alegria eterna, nossos dois corações, unidos para sempre, enlaçados para a eternidade, voarão num mesmo impulso para o céu clemente. Compreendes esta alegria, mãe? Jamais nos deixarmos, nos amarmos para sempre, para sempre? Formar, por assim dizer, ao mesmo tempo dois seres distintos e um só; ser tu e eu ao mesmo tempo? Amar e saber que se é amada, e que a medida do amor que se inspira é a mesma do que se experimenta?
“Aqui embaixo não nos conhecemos; eu te ignoro como tu me ignoras; entre nossos dois Espíritos nossos dois corpos constituem um obstáculo; nós não nos vemos senão confusamente através do véu da carne. Mas, lá no alto, leremos claramente no coração uma da outra. E saber a que ponto a gente se ama é o verdadeiro paraíso, vês?
“Ah! Todas estas promessas de felicidade mística e infinita, longe de acalmar as angústias de Helena, não faziam senão torná-las mais intensas, fazendo-a medir o valor do bem que ela ia perder.
“Entretanto, a intervalos, ao sopro dessas palavras inspiradas, a alma de Helena se evolava quase às alturas serenas onde planava a da Pippione. Suas lágrimas se estancavam, a calma voltava a seu seio desmoronado; parecia-lhe que seres invisíveis flutuavam no quarto, soprando a Blanche as palavras à medida que ela as pronunciava.
“A criança estava adormecida, e em seu sonho ela parecia conversar com alguém que não se via, escutar vozes que só ela ouvia, e lhes responder.
“De repente, um brusco tremor agitou seus membros frágeis, ela abriu largamente os grandes olhos e chamou sua mãe, que sonhava apoiada à janela.
“Ela aproximou-se do leito, e a Pippione tomou sua mão com a mão já úmida pelos últimos suores.
“─ Chegou o momento, disse ela. Esta noite é a última. Eles me chamam, eu os escuto! Eu queria muito ficar ainda, pobre mãe, mas não posso; a vontade deles é mais forte que a minha. Eles estão lá no alto e me fazem sinal.
“─ Loucura! exclamou Helena! visão! sonho! Tu morrer hoje, esta noite, entre os meus braços! Isto é possível?
“─ Não, morrer não, disse a Pippione: Nascer! Eu saio do sonho, em vez de nele entrar; o pesadelo acabou, eu desperto. Oh! Se tu soubesses como é bonito, e que luz brilha aqui, junto à qual o vosso sol não passa de uma mancha negra!
“Ela se deixou cair sobre os travesseiros, ficou um instante silenciosa, depois continuou:
“─ São poucos os instantes que tenho para passar ao vosso lado. Quero que todos estejais aqui para me dizer o que chamais um eterno adeus, e que não é, na realidade, senão um curto até logo. Todos, entendes bem? Primeiro tu, o bom doutor, Úrsula, e Cipriana, e José.
“Este nome foi pronunciado mais baixo que os outros; era o último suspiro, o último pesar humano da Pippione. A partir desse instante ela pertenceria inteiramente ao Céu.
.............................
“─ Era minha filha!
“─ Era!... repetiu com voz quase paternal o doutor Ozam, atraindo Helena para o seu peito. Era!... Agora não é mais... O que resta aqui? Um pouco de carne meio decomposta, nervos que não vibram mais, sangue que engrossa, olhos sem olhar, uma garganta sem voz, ouvidos que não mais escutam, um pouco de limo!
“Vossa filha, este cadáver no qual a Natureza fecunda já faz germinar a vida inferior que disseminará os seus elementos? ─ Vossa filha, este lodo que amanhã reverdecerá em erva, florescerá em rosas, e devolverá ao solo todas as forças vivas que dele tirou? Não, não. Isto não é a vossa filha! Isto não é senão a vestimenta delicada e encantadora que ela tinha criado para atravessar a nossa vida de provações, um andrajo que ela abandonou desdenhosa, como um vestido velho que se tira!
“Se quiserdes ter uma lembrança viva de vossa filha, pobre senhora, é preciso olhar alhures... e mais alto.
“─ Vós também credes nisto, doutor, perguntou ela, nessa outra vida? Diziam que éreis materialista.
“O doutor teve um suave sorriso irônico.
“─ Talvez eu o seja, mas não da maneira como o entendeis.
“Não é numa outra vida que eu creio, mas na vida eterna, na vida que não tem começo e que, por consequência, não terá fim. ─ Cada um dos seres, no começo igual aos outros, faz, por assim dizer, a educação de sua alma e aumenta as suas faculdades e o seu poder, na medida de seus méritos e de seus atos. Consequência imediata desta argumentação: essa alma mais perfeita agrega ao redor de si um envoltório igualmente mais perfeito. Depois, enfim, chega um dia em que esse envoltório não lhe basta mais, e então, como se diz, a alma rompe o corpo.
“Mas ela o rompe para encontrar um outro mais adequado às suas necessidades e qualidades novas? Onde? Quem sabe? Talvez num desses mundos superiores que brilham sobre as nossas cabeças, num mundo em que ela encontrará um corpo mais perfeito, dotado de órgãos mais sensíveis, por isto mesmo melhor e mais feliz!
........................
“Nós mesmos, seres perfeitos, desde o primeiro dia dotados de todos os sentidos que nos põem em relação com a Natureza exterior, de quantos esforços não necessitamos! Que trabalhos latentes não são necessários para que a criança se torne homem, o ser ignorante e fraco, rei da Terra! E, incessantemente, até à morte, os corajosos e os bons perseveram nesta vida árdua de trabalho; eles expandem a inteligência pelo estudo, o coração pelo devotamento. Eis o trabalho misterioso da crisálida humana, o trabalho pelo qual ela adquire o poder e o direito de romper o envoltório do corpo e planar com as asas.”
OBSERVAÇÃO: O autor, que até aqui tinha guardado o anonimato, é o Sr. du Boys, jovem escritor dramático. Por certas expressões quase textuais, vê-se que evidentemente ele se inspirou na Doutrina.
“Meu paraíso, querida mãe, dizia à Condessa de Monte Cristo a sua filha agonizante, será ficar junto a ti, perto de vós! sempre viva em vossos pensamentos, escutando-vos e vos respondendo, conversando baixinho com as vossas almas.
“Quando a flor embalsamar o jardim, e a levares aos teus lábios, estarei na flor e serei eu quem receberá o beijo! Também me farei o raio, o sopro que passa, o murmúrio que soa. O vento que agitar os teus cabelos será a minha carícia; o cheiro que dos lilases floridos se elevar para a tua janela será o meu hálito; o canto longínquo que te fará chorar será a minha voz.
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“─ Mãe, não blasfemes! Nada de cólera contra Deus! Vamos! Essas cóleras e essas blasfêmias nos separariam para sempre.
“Enquanto estiveres aqui embaixo, eu me farei tua companheira de exílio; mais tarde, porém, quando resignada às vontades do nosso Pai que está nos Céus, por tua vez terás fechado os olhos para não mais abri-los; então, por minha vez, estarei à tua cabeceira, esperando a tua libertação, e ébrios de uma alegria eterna, nossos dois corações, unidos para sempre, enlaçados para a eternidade, voarão num mesmo impulso para o céu clemente. Compreendes esta alegria, mãe? Jamais nos deixarmos, nos amarmos para sempre, para sempre? Formar, por assim dizer, ao mesmo tempo dois seres distintos e um só; ser tu e eu ao mesmo tempo? Amar e saber que se é amada, e que a medida do amor que se inspira é a mesma do que se experimenta?
“Aqui embaixo não nos conhecemos; eu te ignoro como tu me ignoras; entre nossos dois Espíritos nossos dois corpos constituem um obstáculo; nós não nos vemos senão confusamente através do véu da carne. Mas, lá no alto, leremos claramente no coração uma da outra. E saber a que ponto a gente se ama é o verdadeiro paraíso, vês?
“Ah! Todas estas promessas de felicidade mística e infinita, longe de acalmar as angústias de Helena, não faziam senão torná-las mais intensas, fazendo-a medir o valor do bem que ela ia perder.
“Entretanto, a intervalos, ao sopro dessas palavras inspiradas, a alma de Helena se evolava quase às alturas serenas onde planava a da Pippione. Suas lágrimas se estancavam, a calma voltava a seu seio desmoronado; parecia-lhe que seres invisíveis flutuavam no quarto, soprando a Blanche as palavras à medida que ela as pronunciava.
“A criança estava adormecida, e em seu sonho ela parecia conversar com alguém que não se via, escutar vozes que só ela ouvia, e lhes responder.
“De repente, um brusco tremor agitou seus membros frágeis, ela abriu largamente os grandes olhos e chamou sua mãe, que sonhava apoiada à janela.
“Ela aproximou-se do leito, e a Pippione tomou sua mão com a mão já úmida pelos últimos suores.
“─ Chegou o momento, disse ela. Esta noite é a última. Eles me chamam, eu os escuto! Eu queria muito ficar ainda, pobre mãe, mas não posso; a vontade deles é mais forte que a minha. Eles estão lá no alto e me fazem sinal.
“─ Loucura! exclamou Helena! visão! sonho! Tu morrer hoje, esta noite, entre os meus braços! Isto é possível?
“─ Não, morrer não, disse a Pippione: Nascer! Eu saio do sonho, em vez de nele entrar; o pesadelo acabou, eu desperto. Oh! Se tu soubesses como é bonito, e que luz brilha aqui, junto à qual o vosso sol não passa de uma mancha negra!
“Ela se deixou cair sobre os travesseiros, ficou um instante silenciosa, depois continuou:
“─ São poucos os instantes que tenho para passar ao vosso lado. Quero que todos estejais aqui para me dizer o que chamais um eterno adeus, e que não é, na realidade, senão um curto até logo. Todos, entendes bem? Primeiro tu, o bom doutor, Úrsula, e Cipriana, e José.
“Este nome foi pronunciado mais baixo que os outros; era o último suspiro, o último pesar humano da Pippione. A partir desse instante ela pertenceria inteiramente ao Céu.
.............................
“─ Era minha filha!
“─ Era!... repetiu com voz quase paternal o doutor Ozam, atraindo Helena para o seu peito. Era!... Agora não é mais... O que resta aqui? Um pouco de carne meio decomposta, nervos que não vibram mais, sangue que engrossa, olhos sem olhar, uma garganta sem voz, ouvidos que não mais escutam, um pouco de limo!
“Vossa filha, este cadáver no qual a Natureza fecunda já faz germinar a vida inferior que disseminará os seus elementos? ─ Vossa filha, este lodo que amanhã reverdecerá em erva, florescerá em rosas, e devolverá ao solo todas as forças vivas que dele tirou? Não, não. Isto não é a vossa filha! Isto não é senão a vestimenta delicada e encantadora que ela tinha criado para atravessar a nossa vida de provações, um andrajo que ela abandonou desdenhosa, como um vestido velho que se tira!
“Se quiserdes ter uma lembrança viva de vossa filha, pobre senhora, é preciso olhar alhures... e mais alto.
“─ Vós também credes nisto, doutor, perguntou ela, nessa outra vida? Diziam que éreis materialista.
“O doutor teve um suave sorriso irônico.
“─ Talvez eu o seja, mas não da maneira como o entendeis.
“Não é numa outra vida que eu creio, mas na vida eterna, na vida que não tem começo e que, por consequência, não terá fim. ─ Cada um dos seres, no começo igual aos outros, faz, por assim dizer, a educação de sua alma e aumenta as suas faculdades e o seu poder, na medida de seus méritos e de seus atos. Consequência imediata desta argumentação: essa alma mais perfeita agrega ao redor de si um envoltório igualmente mais perfeito. Depois, enfim, chega um dia em que esse envoltório não lhe basta mais, e então, como se diz, a alma rompe o corpo.
“Mas ela o rompe para encontrar um outro mais adequado às suas necessidades e qualidades novas? Onde? Quem sabe? Talvez num desses mundos superiores que brilham sobre as nossas cabeças, num mundo em que ela encontrará um corpo mais perfeito, dotado de órgãos mais sensíveis, por isto mesmo melhor e mais feliz!
........................
“Nós mesmos, seres perfeitos, desde o primeiro dia dotados de todos os sentidos que nos põem em relação com a Natureza exterior, de quantos esforços não necessitamos! Que trabalhos latentes não são necessários para que a criança se torne homem, o ser ignorante e fraco, rei da Terra! E, incessantemente, até à morte, os corajosos e os bons perseveram nesta vida árdua de trabalho; eles expandem a inteligência pelo estudo, o coração pelo devotamento. Eis o trabalho misterioso da crisálida humana, o trabalho pelo qual ela adquire o poder e o direito de romper o envoltório do corpo e planar com as asas.”
OBSERVAÇÃO: O autor, que até aqui tinha guardado o anonimato, é o Sr. du Boys, jovem escritor dramático. Por certas expressões quase textuais, vê-se que evidentemente ele se inspirou na Doutrina.
O Barão Clootz
Sob o título de: Um voto humanitário, Anacharsis Clootz, barão prussiano, convencional francês, aos seus concidadãos de Paris e de Berlim, o Progrès de Lyon, de 27 de abril de 1867, publicava, sob a forma de uma carta supostamente escrita do outro mundo, pelo convencional Clootz, um artigo muito longo que assim começava:
“No outro mundo, onde eu habito, desde a terrível jornada de 24 de março de 1794, que, confesso, me desiludiu um pouco sobre os homens e sobre as coisas, só a palavra guerra guarda o privilégio de me recordar as preocupações da política terrestre. Aquilo que mais amei, que digo eu? adorei e servi, quando morava em vosso planeta, foi a fraternidade dos povos e a paz. A esse grande objeto de estudo e de amor, dei um penhor muito sério: minha cabeça, à qual as minhas cem mil libras de renda, aos olhos de muita gente, acrescentavam importante valor. O que de fato me consolava um pouco, ao subir os degraus do cadafalso, eram os considerandos pelos quais Saint-Just acabava de justificar a minha prisão. Ali era dito, se bem me lembro, que de então em diante, a paz, a justiça e a probidade seriam postas na ordem do dia. Eu teria dado a minha vida, e o declaro convictamente sem hesitar, e duas vezes em vez de uma, para obter a metade desse resultado. E notai, por favor, que meu sacrifício era mais completo e mais profundo do que teria sido o da maior parte dos meus colegas. Eu agia de boa-fé e guardava o respeito à justiça no fundo do coração; mas, sem falar dos cultos aos quais tinha horror, o Ser supremo de Robespierre, ele mesmo, me maltratava os nervos, e a vida futura tinha para mim a aparência de um belo conto de fadas. Certamente me perguntareis o que ela é. Eu estava errado? Eu tinha razão? Eis o grande segredo dos mortos. Julgai vós mesmos, por vossa conta e risco. Contudo, parece que eu ia um pouco longe, porque, nesta ocasião solene, me é permitido vos escrever.”
Sendo o artigo exclusivamente político e saindo do nossos propósitos, citamos apenas este fragmento, para mostrar que, mesmo nesses graves assuntos, podemos tirar proveito da ideia dos mortos dirigindo-se aos vivos, para junto a estes continuar relações interrompidas. A cada instante o Espiritismo vê realizar-se esta ficção. É mais que provável que foi ele que deu esta ideia. Ademais, se ela fosse dada como real, ele não a desaprovaria.
“No outro mundo, onde eu habito, desde a terrível jornada de 24 de março de 1794, que, confesso, me desiludiu um pouco sobre os homens e sobre as coisas, só a palavra guerra guarda o privilégio de me recordar as preocupações da política terrestre. Aquilo que mais amei, que digo eu? adorei e servi, quando morava em vosso planeta, foi a fraternidade dos povos e a paz. A esse grande objeto de estudo e de amor, dei um penhor muito sério: minha cabeça, à qual as minhas cem mil libras de renda, aos olhos de muita gente, acrescentavam importante valor. O que de fato me consolava um pouco, ao subir os degraus do cadafalso, eram os considerandos pelos quais Saint-Just acabava de justificar a minha prisão. Ali era dito, se bem me lembro, que de então em diante, a paz, a justiça e a probidade seriam postas na ordem do dia. Eu teria dado a minha vida, e o declaro convictamente sem hesitar, e duas vezes em vez de uma, para obter a metade desse resultado. E notai, por favor, que meu sacrifício era mais completo e mais profundo do que teria sido o da maior parte dos meus colegas. Eu agia de boa-fé e guardava o respeito à justiça no fundo do coração; mas, sem falar dos cultos aos quais tinha horror, o Ser supremo de Robespierre, ele mesmo, me maltratava os nervos, e a vida futura tinha para mim a aparência de um belo conto de fadas. Certamente me perguntareis o que ela é. Eu estava errado? Eu tinha razão? Eis o grande segredo dos mortos. Julgai vós mesmos, por vossa conta e risco. Contudo, parece que eu ia um pouco longe, porque, nesta ocasião solene, me é permitido vos escrever.”
Sendo o artigo exclusivamente político e saindo do nossos propósitos, citamos apenas este fragmento, para mostrar que, mesmo nesses graves assuntos, podemos tirar proveito da ideia dos mortos dirigindo-se aos vivos, para junto a estes continuar relações interrompidas. A cada instante o Espiritismo vê realizar-se esta ficção. É mais que provável que foi ele que deu esta ideia. Ademais, se ela fosse dada como real, ele não a desaprovaria.
Metempsicose
“Conheceis a causa dos ruídos que nos chegam? perguntava a Sra. Des Genêts. Será alguma cena de tigres furiosos que esses senhores nos preparam?
“─ Sossegai, cara amiga, tudo está em segurança, os nossos vivos e os nossos mortos. Escutai a encantadora melodia do rouxinol que canta no salgueiro! Talvez seja a alma de um dos nossos mártires que plana em torno de nós sob essa forma amável. Os mortos têm esses privilégios, e eu de boa vontade me convenço de que eles voltam assim muitas vezes para junto daqueles a quem amaram.
“─ Oh! Se dissésseis a verdade! exclamou vivamente a senhora Des Genêts.
“─ Eu acredito nisto sinceramente, disse a jovem duquesa. É tão bom crer nas coisas consoladoras! Ademais, meu pai, que é muito sábio, como não o ignorais, me assegurou que esta crença tinha sido difundida antigamente por grandes filósofos. O próprio Lesage também nela acredita.”
Esta passagem é tirada de um romance-folhetim intitulado O Calabouço da Torre dos Pinheiros, por Paulin Capmal, publicado pela Liberté de 4 de novembro de 1867. Aqui, a ideia não é tirada da Doutrina Espírita, porque esta, em todos os tempos, ensinou e provou que a alma humana não pode renascer num corpo animal, o que não impede que certos críticos, que não leram a primeira palavra sobre o Espiritismo, repitam que ele professa a metempsicose; mas é sempre o pensamento da alma individual sobrevivendo ao corpo, voltando sob uma forma tangível junto aos que ela amou. Se a ideia não é espírita, é ao menos espiritualista, e melhor seria acreditar na metempsicose do que acreditar no nada. Essa crença pelo menos não é desesperadora como o materialismo; ela nada tem de imoral, ao contrário; ela conduziu todos os povos que a professaram a tratar os animais com doçura e benevolência. A exclamação: É tão bom crer nas coisas consoladoras é o grande segredo do sucesso do Espiritismo.
“─ Sossegai, cara amiga, tudo está em segurança, os nossos vivos e os nossos mortos. Escutai a encantadora melodia do rouxinol que canta no salgueiro! Talvez seja a alma de um dos nossos mártires que plana em torno de nós sob essa forma amável. Os mortos têm esses privilégios, e eu de boa vontade me convenço de que eles voltam assim muitas vezes para junto daqueles a quem amaram.
“─ Oh! Se dissésseis a verdade! exclamou vivamente a senhora Des Genêts.
“─ Eu acredito nisto sinceramente, disse a jovem duquesa. É tão bom crer nas coisas consoladoras! Ademais, meu pai, que é muito sábio, como não o ignorais, me assegurou que esta crença tinha sido difundida antigamente por grandes filósofos. O próprio Lesage também nela acredita.”
Esta passagem é tirada de um romance-folhetim intitulado O Calabouço da Torre dos Pinheiros, por Paulin Capmal, publicado pela Liberté de 4 de novembro de 1867. Aqui, a ideia não é tirada da Doutrina Espírita, porque esta, em todos os tempos, ensinou e provou que a alma humana não pode renascer num corpo animal, o que não impede que certos críticos, que não leram a primeira palavra sobre o Espiritismo, repitam que ele professa a metempsicose; mas é sempre o pensamento da alma individual sobrevivendo ao corpo, voltando sob uma forma tangível junto aos que ela amou. Se a ideia não é espírita, é ao menos espiritualista, e melhor seria acreditar na metempsicose do que acreditar no nada. Essa crença pelo menos não é desesperadora como o materialismo; ela nada tem de imoral, ao contrário; ela conduziu todos os povos que a professaram a tratar os animais com doçura e benevolência. A exclamação: É tão bom crer nas coisas consoladoras é o grande segredo do sucesso do Espiritismo.
Enterro do Sr. Marc Michel
Lê-se no Temps de 27 de março de 1868:
“Ontem, no enterro do Sr. Marc Michel, o Sr. Jules Adenis disse adeus, em nome da Sociedade dos Autores Dramáticos, ao escritor que a comédia alegre e ligeira acaba de perder.
“Encontro esta frase em seu discurso:
“Foi Ferdinand Langlé que recentemente precedeu no túmulo aquele que hoje choramos... E ─ Quem sabe? Quem pode dizê-lo?...─ assim como acompanhamos até aqui estes despojos mortais, talvez a alma de Langlé tenha vindo receber a alma de Marc Michel no limiar da eternidade.”
“Com certeza a falta é de meu espírito muito leviano, mas confesso que me é difícil imaginar, com a gravidade conveniente, a alma do autor de Sourd, de Camarade de lit, de Une sangsue, da Grève des portiers, vir receber no limiar da eternidade a alma do autor de Maman Sabouleux, de Mesdames de Montenfriche, de um Tigre du Bengale e da Station de Champbaudet.
“X. FEYRNET.”
O pensamento emitido pelo Sr. Jules Adenis é do mais puro Espiritismo. Suponhamos que o autor do artigo, o Sr. Feyrnet, que tem dificuldade em manter uma gravidade conveniente ouvindo dizer que a alma do Sr. Langlé talvez estivesse presente e viesse receber a alma de Marc Michel, tivesse tomado a palavra e, por sua vez, assim se tivesse expressado: “Senhores, acabam de vos dizer que a alma do nosso amigo Langlé aqui está, que ela nos vê e nos ouve! Ele não precisaria senão acrescentar que ela pode nos falar. Não acrediteis numa só palavra. A alma de Langlé não existe mais; ou então, o que dá no mesmo, ela se fundiu na imensidade. De Marc Michel não resta mais nada. A mesma coisa acontecerá convosco, quando morrerdes, como também com vossos pais e amigos. Esperar que eles vos esperem, que vos venham receber no desembarque da vida é loucura, superstição, iluminismo. Eis o positivo: Quando se morre, tu está acabado.” Qual dos dois oradores teria achado mais simpatia na assistência? Qual teria enxugado mais lágrimas, dado mais coragem e resignação aos aflitos? O infeliz que não espera mais alívio neste mundo, não teria razões para lhe dizer: “Se é assim, acabemos o mais cedo possível com a vida?” É preciso lamentar o Sr. Feyrnet por não poder conservar-se sério ante a ideia que seu pai e sua mãe, se ele os perdeu, ainda vivem, que eles velam à sua cabeceira e que ele voltará a vê-los.
“Ontem, no enterro do Sr. Marc Michel, o Sr. Jules Adenis disse adeus, em nome da Sociedade dos Autores Dramáticos, ao escritor que a comédia alegre e ligeira acaba de perder.
“Encontro esta frase em seu discurso:
“Foi Ferdinand Langlé que recentemente precedeu no túmulo aquele que hoje choramos... E ─ Quem sabe? Quem pode dizê-lo?...─ assim como acompanhamos até aqui estes despojos mortais, talvez a alma de Langlé tenha vindo receber a alma de Marc Michel no limiar da eternidade.”
“Com certeza a falta é de meu espírito muito leviano, mas confesso que me é difícil imaginar, com a gravidade conveniente, a alma do autor de Sourd, de Camarade de lit, de Une sangsue, da Grève des portiers, vir receber no limiar da eternidade a alma do autor de Maman Sabouleux, de Mesdames de Montenfriche, de um Tigre du Bengale e da Station de Champbaudet.
“X. FEYRNET.”
O pensamento emitido pelo Sr. Jules Adenis é do mais puro Espiritismo. Suponhamos que o autor do artigo, o Sr. Feyrnet, que tem dificuldade em manter uma gravidade conveniente ouvindo dizer que a alma do Sr. Langlé talvez estivesse presente e viesse receber a alma de Marc Michel, tivesse tomado a palavra e, por sua vez, assim se tivesse expressado: “Senhores, acabam de vos dizer que a alma do nosso amigo Langlé aqui está, que ela nos vê e nos ouve! Ele não precisaria senão acrescentar que ela pode nos falar. Não acrediteis numa só palavra. A alma de Langlé não existe mais; ou então, o que dá no mesmo, ela se fundiu na imensidade. De Marc Michel não resta mais nada. A mesma coisa acontecerá convosco, quando morrerdes, como também com vossos pais e amigos. Esperar que eles vos esperem, que vos venham receber no desembarque da vida é loucura, superstição, iluminismo. Eis o positivo: Quando se morre, tu está acabado.” Qual dos dois oradores teria achado mais simpatia na assistência? Qual teria enxugado mais lágrimas, dado mais coragem e resignação aos aflitos? O infeliz que não espera mais alívio neste mundo, não teria razões para lhe dizer: “Se é assim, acabemos o mais cedo possível com a vida?” É preciso lamentar o Sr. Feyrnet por não poder conservar-se sério ante a ideia que seu pai e sua mãe, se ele os perdeu, ainda vivem, que eles velam à sua cabeceira e que ele voltará a vê-los.
Um sonho
Extraído do Figaro, de 12 de abril de 1868:
“Por mais extraordinário que pareça o relato seguinte, o autor, declarando tê-lo recebido do próprio vice-presidente do Corpo Legislativo (o Barão Jérôme David), dá às suas palavras uma autoridade incontestável.
“Durante sua estada em Saint-Cyr, David foi testemunha de um duelo entre dois de seus camaradas de promoção, Lambert e Poirée. Este último recebeu um golpe de espada e foi curar-se na enfermaria, onde seu amigo David subia para vê-lo todos os dias.
“Certa manhã, Poirée lhe pareceu singularmente perturbado; ele crivou-o de perguntas e acabou por lhe arrancar a confissão de que sua emoção vinha de um simples pesadelo.
“─ Eu sonhava que estávamos à beira de um rio, eu recebia uma bala na testa, acima do olho, e tu me sustinhas nos braços; eu sofria muito e me sentia morrer. Eu te recomendava minha mulher e os meus filhos, quando acordei.
“─ Meu caro, estás com febre, respondeu-lhe David sorrindo; refaze-te; estás em teu leito, não és casado e não tens bala acima do olho; é um sonho muito bobo; não me atormentes assim, se queres curar-te depressa.
“─ É singular, murmurou Poirée, jamais acreditei em sonhos, não creio, contudo, estou abalado.
“Dez anos depois o exército francês desembarcava na Crimeia. Os saintcyrianos se tinham perdido de vista. David, oficial ajudante ligado à divisão do príncipe Napoleão, recebeu ordem de ir descobrir um vau a montante do Alma. Para impedir que os russos o fizessem prisioneiro, apoiaram esse reconhecimento por uma companhia de caçadores, tomada do regimento mais próximo. Os russos faziam cair uma chuva de balas sobre os homens da escolta, que se estenderam em atiradores para responder.
“Não se tinham passado dez minutos quando um dos nossos oficiais rolou por terra, mortalmente ferido. O capitão David saltou do cavalo e correu para erguê-lo. Ele apoiou a cabeça em seu braço esquerdo e, destacando o cantil da cintura, aproximou-o dos lábios do ferido. Um buraco aberto acima do olho ensanguentavalhe o rosto; um soldado trouxe um pouco de água e a derramou sobre a cabeça do moribundo, que já estertorava.
“David olhou com atenção os traços, que parecia reconhecer. Um nome foi pronunciado ao seu lado; não havia dúvida, era ele, era Poirée! Ele o chamou; seus olhos se abriram e o agonizante por sua vez reconheceu o camarada de Saint-Cyr... “─ David! tu aqui?... O sonho... minha mulher...
“Estas palavras entrecortadas não tinham acabado e já a cabeça caía inerte no braço de David. Poirée estava morto, deixando sua mulher e seus filhos à lembrança e à amizade de David.
“Eu não ousaria contar semelhante história se eu mesmo não a tivesse ouvido do honrado vice-presidente do Corpo Legislativo.
“Vox populi.”
A que propósito o narrador ajunta as palavras vox populi? Poder-se-ia entendêlas assim: Os fatos desta natureza são de tal modo frequentes, que são atestados pela voz do povo, isto é, por um assentimento geral.
“Por mais extraordinário que pareça o relato seguinte, o autor, declarando tê-lo recebido do próprio vice-presidente do Corpo Legislativo (o Barão Jérôme David), dá às suas palavras uma autoridade incontestável.
“Durante sua estada em Saint-Cyr, David foi testemunha de um duelo entre dois de seus camaradas de promoção, Lambert e Poirée. Este último recebeu um golpe de espada e foi curar-se na enfermaria, onde seu amigo David subia para vê-lo todos os dias.
“Certa manhã, Poirée lhe pareceu singularmente perturbado; ele crivou-o de perguntas e acabou por lhe arrancar a confissão de que sua emoção vinha de um simples pesadelo.
“─ Eu sonhava que estávamos à beira de um rio, eu recebia uma bala na testa, acima do olho, e tu me sustinhas nos braços; eu sofria muito e me sentia morrer. Eu te recomendava minha mulher e os meus filhos, quando acordei.
“─ Meu caro, estás com febre, respondeu-lhe David sorrindo; refaze-te; estás em teu leito, não és casado e não tens bala acima do olho; é um sonho muito bobo; não me atormentes assim, se queres curar-te depressa.
“─ É singular, murmurou Poirée, jamais acreditei em sonhos, não creio, contudo, estou abalado.
“Dez anos depois o exército francês desembarcava na Crimeia. Os saintcyrianos se tinham perdido de vista. David, oficial ajudante ligado à divisão do príncipe Napoleão, recebeu ordem de ir descobrir um vau a montante do Alma. Para impedir que os russos o fizessem prisioneiro, apoiaram esse reconhecimento por uma companhia de caçadores, tomada do regimento mais próximo. Os russos faziam cair uma chuva de balas sobre os homens da escolta, que se estenderam em atiradores para responder.
“Não se tinham passado dez minutos quando um dos nossos oficiais rolou por terra, mortalmente ferido. O capitão David saltou do cavalo e correu para erguê-lo. Ele apoiou a cabeça em seu braço esquerdo e, destacando o cantil da cintura, aproximou-o dos lábios do ferido. Um buraco aberto acima do olho ensanguentavalhe o rosto; um soldado trouxe um pouco de água e a derramou sobre a cabeça do moribundo, que já estertorava.
“David olhou com atenção os traços, que parecia reconhecer. Um nome foi pronunciado ao seu lado; não havia dúvida, era ele, era Poirée! Ele o chamou; seus olhos se abriram e o agonizante por sua vez reconheceu o camarada de Saint-Cyr... “─ David! tu aqui?... O sonho... minha mulher...
“Estas palavras entrecortadas não tinham acabado e já a cabeça caía inerte no braço de David. Poirée estava morto, deixando sua mulher e seus filhos à lembrança e à amizade de David.
“Eu não ousaria contar semelhante história se eu mesmo não a tivesse ouvido do honrado vice-presidente do Corpo Legislativo.
“Vox populi.”
A que propósito o narrador ajunta as palavras vox populi? Poder-se-ia entendêlas assim: Os fatos desta natureza são de tal modo frequentes, que são atestados pela voz do povo, isto é, por um assentimento geral.
Espíritos batedores na Rússia
Remetem-nos de Riga, em data de 8 de abril de 1868, o seguinte extrato do Courrier russe, de São Petersburgo:
“Acreditais em Espíritos batedores? De minha parte, absolutamente não, contudo, acabo de ver um fato material, palpável, que de tal modo foge das regras do senso comum, e também está de tal modo em desacordo com os princípios de estabilidade e de gravidade dos corpos que me inculcou o meu professor do quarto ano, que não sei qual dos dois é mais ferido: o Espírito ou eu.
“Nosso secretário da redação recebeu, outro dia, um senhor de rosto agradável, de uma idade que não podemos atribuir-lhe a ideia de uma pilhéria de mau gosto; cumprimentos, apresentações etc.; tudo acabado, o senhor conta que vem ao nosso escritório pedir um conselho; que o que lhe acontece está de tal modo fora de todos os fatos da vida social, que ele julga seu dever dar-lhe publicidade.
“─ ‘Minha casa, disse ele, está cheia de Espíritos batedores; todas as noites, pelas dez horas, eles começam seus exercícios, transportando os objetos menos transportáveis, batendo, pulando e, numa palavra, pondo todo o meu apartamento de pernas para o ar. Pedi ajuda à polícia, e um soldado passou várias noites em minha casa. A desordem não cessou, embora a cada alarme ele tenha desembainhado o sabre de maneira ameaçadora. Minha casa é isolada, só tenho uma criada, minha mulher e minha filha, e quando os fatos se passam, estamos reunidos. Moro numa rua muito afastada, em Vassili-Ostroff.’
“Eu tinha entrado durante a conversa e o escutava de boca aberta. Eu disse que não acredito em Espíritos batedores, mas isso de maneira nenhuma. Expliquei a esse senhor que para dar publicidade a esses fatos, ainda precisava que estivéssemos convencidos de sua existência e lhe propus ir pessoalmente verificar a coisa. Marcamos encontro para a noite. Às nove horas eu estava na casa do meu homem. Introduziram-me numa pequena sala mobiliada muito confortavelmente; examinei a disposição das peças; eram apenas quatro, incluindo a cozinha, tudo ocupando o andar do meio de uma casa de madeira; ninguém mora em cima; o térreo é ocupado por um armazém. Pelas dez horas estávamos reunidos na sala, meu homem, sua mulher, sua filha, a cozinheira e eu. Uma meia hora, e nada de novo! De repente uma porta se abriu e uma galocha caiu no meio da sala; acreditei num comparsa e quis certificar-me de que a escada estava vazia, quando a galocha saltou sobre um móvel e de lá novamente no assoalho; depois foi a vez das cadeiras na peça vizinha, que não tinha saída senão pela que ocupávamos, e que eu acabara de verificar que estava perfeitamente vazia. Só ao cabo de uma hora o silêncio se restabeleceu e o Espírito, os Espíritos, o hábil comparsa, ou o Deus é que sabe, desapareceu, deixando-nos numa estupefação que, eu vos asseguro, nada tinha de jogo. Eis os fatos, eu os vi com os próprios olhos; não me encarrego de vo-los explicar. Se desejardes vós mesmos procurar a explicação, temos à vossa disposição todas as informações para irdes fazer vossas observações nos locais.
“HENRI DE BRENNE.”
“Acreditais em Espíritos batedores? De minha parte, absolutamente não, contudo, acabo de ver um fato material, palpável, que de tal modo foge das regras do senso comum, e também está de tal modo em desacordo com os princípios de estabilidade e de gravidade dos corpos que me inculcou o meu professor do quarto ano, que não sei qual dos dois é mais ferido: o Espírito ou eu.
“Nosso secretário da redação recebeu, outro dia, um senhor de rosto agradável, de uma idade que não podemos atribuir-lhe a ideia de uma pilhéria de mau gosto; cumprimentos, apresentações etc.; tudo acabado, o senhor conta que vem ao nosso escritório pedir um conselho; que o que lhe acontece está de tal modo fora de todos os fatos da vida social, que ele julga seu dever dar-lhe publicidade.
“─ ‘Minha casa, disse ele, está cheia de Espíritos batedores; todas as noites, pelas dez horas, eles começam seus exercícios, transportando os objetos menos transportáveis, batendo, pulando e, numa palavra, pondo todo o meu apartamento de pernas para o ar. Pedi ajuda à polícia, e um soldado passou várias noites em minha casa. A desordem não cessou, embora a cada alarme ele tenha desembainhado o sabre de maneira ameaçadora. Minha casa é isolada, só tenho uma criada, minha mulher e minha filha, e quando os fatos se passam, estamos reunidos. Moro numa rua muito afastada, em Vassili-Ostroff.’
“Eu tinha entrado durante a conversa e o escutava de boca aberta. Eu disse que não acredito em Espíritos batedores, mas isso de maneira nenhuma. Expliquei a esse senhor que para dar publicidade a esses fatos, ainda precisava que estivéssemos convencidos de sua existência e lhe propus ir pessoalmente verificar a coisa. Marcamos encontro para a noite. Às nove horas eu estava na casa do meu homem. Introduziram-me numa pequena sala mobiliada muito confortavelmente; examinei a disposição das peças; eram apenas quatro, incluindo a cozinha, tudo ocupando o andar do meio de uma casa de madeira; ninguém mora em cima; o térreo é ocupado por um armazém. Pelas dez horas estávamos reunidos na sala, meu homem, sua mulher, sua filha, a cozinheira e eu. Uma meia hora, e nada de novo! De repente uma porta se abriu e uma galocha caiu no meio da sala; acreditei num comparsa e quis certificar-me de que a escada estava vazia, quando a galocha saltou sobre um móvel e de lá novamente no assoalho; depois foi a vez das cadeiras na peça vizinha, que não tinha saída senão pela que ocupávamos, e que eu acabara de verificar que estava perfeitamente vazia. Só ao cabo de uma hora o silêncio se restabeleceu e o Espírito, os Espíritos, o hábil comparsa, ou o Deus é que sabe, desapareceu, deixando-nos numa estupefação que, eu vos asseguro, nada tinha de jogo. Eis os fatos, eu os vi com os próprios olhos; não me encarrego de vo-los explicar. Se desejardes vós mesmos procurar a explicação, temos à vossa disposição todas as informações para irdes fazer vossas observações nos locais.
“HENRI DE BRENNE.”
Os detalhes fornecidos pelos jornais sobre o flagelo que neste momento dizima as populações árabes da Argélia nada têm de exagero, e são confirmados por todas as correspondências particulares. Um dos nossos assinantes de Sétif, o Sr. Dumas, teve a bondade de nos enviar uma fotografia representando a multidão de indígenas reunidos em frente à casa onde distribuem socorros. Esse desenho, de uma verdade chocante, é acompanhado da seguinte notícia impressa:
“Depois dos anos sucessivamente calamitosos que nossa grande colônia atravessou, um flagelo ainda mais terrível veio abater-se sobre ela: a fome.
“Apenas se tinham feito sentir os primeiros rigores do inverno, vê-se que à nossa porta os árabes morrem de fome. Eles chegam em bandos numerosos, seminus, com o corpo extenuado, chorando de fome e de frio, implorando a comiseração pública, disputando à voracidade dos cães alguns restos atirados com as imundícies na via pública.
“Embora eles próprios reduzidos a cruéis extremos, os habitantes de Sétif não podem contemplar com olhar impassível tamanha miséria. Logo, e espontaneamente, organizou-se uma comissão de beneficência, sob a presidência do Sr. Bizet, cura de Sétif. Foi aberta uma subscrição, cada um dá o seu óbolo e, em consequência, foram distribuídos socorros diários no presbitério, a duzentas e cinquenta mulheres ou crianças indígenas.
“Nos últimos dias de janeiro, enquanto uma neve abundante e longamente desejada caía em nossas regiões, pôde-se fazer melhor ainda. Foi instalado um forno num vasto local; ali, duas vezes por dia, os membros da comissão distribuem alimentos, não mais a duzentas e cinquenta, mas a quinhentas mulheres ou crianças indígenas. Ali, enfim, esses infelizes encontram um asilo e um abrigo.
“Mas, ah! Os europeus são obrigados, muito a contragosto, a limitar seus socorros às mulheres e às crianças... Para aliviar todas as misérias seria preciso uma boa parte do trigo que os poderosos caïds mantêm em seus silos. Entretanto, eles esperam poder continuar suas distribuições até metade do mês de abril.”
Se nesta circunstância não abrimos uma subscrição especial nos escritórios da Revista, é que sabíamos que nossos irmãos em crença não foram os últimos a levar sua oferenda aos escritórios de sua circunscrição, para tal efeito abertos pelos cuidados da autoridade. Os donativos que nos foram enviados para esse efeito, lá foram depositados.
O Sr. capitão Bourgès, da guarnição de Laghouat, a respeito escreve-nos o seguinte:
“Há alguns anos os flagelos se sucedem na Argélia: tremores de terra, invasão de gafanhotos, cólera, seca, tifo, fome, miséria profunda vieram, um a um, atingir os indígenas que agora expiam sua imprevidência e seu fanatismo. Os homens e os próprios animais morrem de fome e se extinguem sem ruído. A fome se estende ao Marrocos e à Tunísia. Entretanto, creio que a Argélia é mais flagelada. Não poderíeis crer quanto é comovente ver esses corpos macilentos e fanados, procurando alimento em toda parte, disputando com os cães vagabundos. Pela manhã, esses esqueletos vivos correm em volta do campo e se precipitam sobre os excrementos para deles extrair os grãos de cevada que os cavalos não digeriram e com os quais se repastam imediatamente. Outros roem ossos para sugar a gelatina que neles ainda se pode encontrar, ou comem a erva rara que cresce nas proximidades do oásis. Do meio desta miséria surge uma promiscuidade horrível, que se espalha nas últimas camadas da colônia, e espalha nos corpos materiais essas chagas corrosivas que deviam ser a lepra da antiguidade. Meus olhos se fecham para não ver tanta vergonha, e minha alma sobe ao Pai celeste, para lhe pedir que preserve os bons do contato impuro e dê aos homens fracos a força de não se deixarem arrastar nesse abismo malsão.
“A Humanidade ainda está muito longe do progresso moral que certos filósofos julgam já realizado. Em redor de mim não vejo senão epicuristas, que não querem ouvir falar do Espírito; eles não querem sair da animalidade; seu orgulho se atribui uma nobre origem e, contudo, seus atos dizem claramente o que eles foram outrora.
“Vendo o que se passa, acreditar-se-ia realmente que a raça árabe está fadada a desaparecer da Terra, porque, malgrado a caridade que se exerce para com ela, e a ajuda que lhe levam, ela se compraz em sua preguiça, sem nenhum sentimento de reconhecimento. Essa miséria física, proveniente das chagas morais, ainda tem sua utilidade. O egoísta, obsidiado, acotovelado a toda hora pelo infortunado que o segue, acaba abrindo a mão, e seu coração comovido sente, enfim, as suaves alegrias proporcionadas pela caridade. Acaba de nascer um sentimento que não se apagará e talvez mesmo o do reconhecimento surja no coração daquele que é assistido. Então se forma um elo simpático; novos socorros vêm dar vida ao infeliz que se extinguia e, do desespero, este último passa à esperança. O que parecia um mal fez nascer um bem: um egoísta a menos e um homem corajoso a mais.”
Os Espíritos não se enganaram quando anunciaram que flagelos de toda sorte devastariam a Terra. Sabe-se que a Argélia não é o único país em prova. Na Revista de julho de 1867, descrevemos a terrível moléstia que há um ano flagelava a ilha Maurício. Uma carta recente diz que à doença vieram juntar-se novas desgraças, e muitas outras regiões neste momento são vítimas de acontecimentos desastrosos.
Deve-se acusar a Providência por todas essas misérias? Não, mas a ignorância, a incúria, consequência da ignorância, o egoísmo, o orgulho e as paixões dos homens. Deus não quer senão o bem; ele tudo fez para o bem; ele deu aos homens os meios para serem felizes; a eles cabe aplicá-los, senão quiserem adquirir experiência às próprias custas. Seria fácil demonstrar que todos os flagelos poderiam ser conjurados, ou pelo menos atenuados, de maneira a paralisar os seus efeitos. É o que faremos posteriormente, numa obra especial. Os homens não devem queixar-se senão de si mesmos pelos males que suportam. A Argélia nos oferece neste momento um notável exemplo: são as populações árabes, despreocupadas e imprevidentes, embrutecidas pelo fanatismo, que sofrem fome, ao passo que os Europeus souberam prevenir-se contra ela. Mas há outros flagelos não menos desastrosos, contra os quais estes últimos ainda não souberam premunir-se.
A própria violência do mal constrangerá os homens a buscar o remédio, e quando eles tiverem inutilmente esgotado os paliativos, compreenderão a necessidade de atacar o mal pela raiz, por meios heróicos. Este será um dos resultados da transformação que se opera na Humanidade.
Mas, perguntarão, que importa aos que sofrem agora a felicidade das gerações futuras? Eles terão tido o trabalho, e os outros o proveito; eles terão trabalhado, suportado o fardo de todas as misérias inseparáveis da ignorância, preparado os caminhos, e os outros, porque Deus os terá feito nascer em tempos melhores, colherão. O que faz às vítimas das exações da Idade Média o regime mais sadio no qual vivemos? Pode a isto chamar-se justiça?
É fato que, até hoje, nenhuma filosofia, nenhuma doutrina religiosa tinha resolvido essa grave questão, de tão poderoso interesse, entretanto, para a Humanidade. Só o Espiritismo lhe dá uma solução racional pela reencarnação, essa chave de tantos problemas que se julgavam insolúveis. Pelo fato da pluralidade das existências, as gerações que se sucedem são compostas das mesmas individualidades espirituais que renascem em diferentes épocas e tiram proveito dos melhoramentos que elas próprias prepararam; da experiência que adquiriram no passado. Não são novos homens que nascem; são os mesmos homens que renascem mais adiantados. Trabalhando cada geração para o futuro, na realidade trabalha em proveito próprio. A Idade Média foi seguramente uma época muito calamitosa; revivendo hoje, os homens daquele tempo se beneficiam do progresso realizado e são mais felizes, porque têm melhores instituições. Mas, quem fez melhores essas instituições? Os mesmos que outrora as tinham feito más. Devendo os de hoje reviver mais tarde, num meio ainda mais depurado, colherão o que houverem semeado; serão mais esclarecidos, e nem os seus sofrimentos, nem seus trabalhos anteriores terão sido em pura perda. Que coragem, que resignação não lhes daria esta ideia, inculcada no espírito dos homens! (Vide A Gênese, Cap. XVIII, nº 34 e 35).
“Depois dos anos sucessivamente calamitosos que nossa grande colônia atravessou, um flagelo ainda mais terrível veio abater-se sobre ela: a fome.
“Apenas se tinham feito sentir os primeiros rigores do inverno, vê-se que à nossa porta os árabes morrem de fome. Eles chegam em bandos numerosos, seminus, com o corpo extenuado, chorando de fome e de frio, implorando a comiseração pública, disputando à voracidade dos cães alguns restos atirados com as imundícies na via pública.
“Embora eles próprios reduzidos a cruéis extremos, os habitantes de Sétif não podem contemplar com olhar impassível tamanha miséria. Logo, e espontaneamente, organizou-se uma comissão de beneficência, sob a presidência do Sr. Bizet, cura de Sétif. Foi aberta uma subscrição, cada um dá o seu óbolo e, em consequência, foram distribuídos socorros diários no presbitério, a duzentas e cinquenta mulheres ou crianças indígenas.
“Nos últimos dias de janeiro, enquanto uma neve abundante e longamente desejada caía em nossas regiões, pôde-se fazer melhor ainda. Foi instalado um forno num vasto local; ali, duas vezes por dia, os membros da comissão distribuem alimentos, não mais a duzentas e cinquenta, mas a quinhentas mulheres ou crianças indígenas. Ali, enfim, esses infelizes encontram um asilo e um abrigo.
“Mas, ah! Os europeus são obrigados, muito a contragosto, a limitar seus socorros às mulheres e às crianças... Para aliviar todas as misérias seria preciso uma boa parte do trigo que os poderosos caïds mantêm em seus silos. Entretanto, eles esperam poder continuar suas distribuições até metade do mês de abril.”
Se nesta circunstância não abrimos uma subscrição especial nos escritórios da Revista, é que sabíamos que nossos irmãos em crença não foram os últimos a levar sua oferenda aos escritórios de sua circunscrição, para tal efeito abertos pelos cuidados da autoridade. Os donativos que nos foram enviados para esse efeito, lá foram depositados.
O Sr. capitão Bourgès, da guarnição de Laghouat, a respeito escreve-nos o seguinte:
“Há alguns anos os flagelos se sucedem na Argélia: tremores de terra, invasão de gafanhotos, cólera, seca, tifo, fome, miséria profunda vieram, um a um, atingir os indígenas que agora expiam sua imprevidência e seu fanatismo. Os homens e os próprios animais morrem de fome e se extinguem sem ruído. A fome se estende ao Marrocos e à Tunísia. Entretanto, creio que a Argélia é mais flagelada. Não poderíeis crer quanto é comovente ver esses corpos macilentos e fanados, procurando alimento em toda parte, disputando com os cães vagabundos. Pela manhã, esses esqueletos vivos correm em volta do campo e se precipitam sobre os excrementos para deles extrair os grãos de cevada que os cavalos não digeriram e com os quais se repastam imediatamente. Outros roem ossos para sugar a gelatina que neles ainda se pode encontrar, ou comem a erva rara que cresce nas proximidades do oásis. Do meio desta miséria surge uma promiscuidade horrível, que se espalha nas últimas camadas da colônia, e espalha nos corpos materiais essas chagas corrosivas que deviam ser a lepra da antiguidade. Meus olhos se fecham para não ver tanta vergonha, e minha alma sobe ao Pai celeste, para lhe pedir que preserve os bons do contato impuro e dê aos homens fracos a força de não se deixarem arrastar nesse abismo malsão.
“A Humanidade ainda está muito longe do progresso moral que certos filósofos julgam já realizado. Em redor de mim não vejo senão epicuristas, que não querem ouvir falar do Espírito; eles não querem sair da animalidade; seu orgulho se atribui uma nobre origem e, contudo, seus atos dizem claramente o que eles foram outrora.
“Vendo o que se passa, acreditar-se-ia realmente que a raça árabe está fadada a desaparecer da Terra, porque, malgrado a caridade que se exerce para com ela, e a ajuda que lhe levam, ela se compraz em sua preguiça, sem nenhum sentimento de reconhecimento. Essa miséria física, proveniente das chagas morais, ainda tem sua utilidade. O egoísta, obsidiado, acotovelado a toda hora pelo infortunado que o segue, acaba abrindo a mão, e seu coração comovido sente, enfim, as suaves alegrias proporcionadas pela caridade. Acaba de nascer um sentimento que não se apagará e talvez mesmo o do reconhecimento surja no coração daquele que é assistido. Então se forma um elo simpático; novos socorros vêm dar vida ao infeliz que se extinguia e, do desespero, este último passa à esperança. O que parecia um mal fez nascer um bem: um egoísta a menos e um homem corajoso a mais.”
Os Espíritos não se enganaram quando anunciaram que flagelos de toda sorte devastariam a Terra. Sabe-se que a Argélia não é o único país em prova. Na Revista de julho de 1867, descrevemos a terrível moléstia que há um ano flagelava a ilha Maurício. Uma carta recente diz que à doença vieram juntar-se novas desgraças, e muitas outras regiões neste momento são vítimas de acontecimentos desastrosos.
Deve-se acusar a Providência por todas essas misérias? Não, mas a ignorância, a incúria, consequência da ignorância, o egoísmo, o orgulho e as paixões dos homens. Deus não quer senão o bem; ele tudo fez para o bem; ele deu aos homens os meios para serem felizes; a eles cabe aplicá-los, senão quiserem adquirir experiência às próprias custas. Seria fácil demonstrar que todos os flagelos poderiam ser conjurados, ou pelo menos atenuados, de maneira a paralisar os seus efeitos. É o que faremos posteriormente, numa obra especial. Os homens não devem queixar-se senão de si mesmos pelos males que suportam. A Argélia nos oferece neste momento um notável exemplo: são as populações árabes, despreocupadas e imprevidentes, embrutecidas pelo fanatismo, que sofrem fome, ao passo que os Europeus souberam prevenir-se contra ela. Mas há outros flagelos não menos desastrosos, contra os quais estes últimos ainda não souberam premunir-se.
A própria violência do mal constrangerá os homens a buscar o remédio, e quando eles tiverem inutilmente esgotado os paliativos, compreenderão a necessidade de atacar o mal pela raiz, por meios heróicos. Este será um dos resultados da transformação que se opera na Humanidade.
Mas, perguntarão, que importa aos que sofrem agora a felicidade das gerações futuras? Eles terão tido o trabalho, e os outros o proveito; eles terão trabalhado, suportado o fardo de todas as misérias inseparáveis da ignorância, preparado os caminhos, e os outros, porque Deus os terá feito nascer em tempos melhores, colherão. O que faz às vítimas das exações da Idade Média o regime mais sadio no qual vivemos? Pode a isto chamar-se justiça?
É fato que, até hoje, nenhuma filosofia, nenhuma doutrina religiosa tinha resolvido essa grave questão, de tão poderoso interesse, entretanto, para a Humanidade. Só o Espiritismo lhe dá uma solução racional pela reencarnação, essa chave de tantos problemas que se julgavam insolúveis. Pelo fato da pluralidade das existências, as gerações que se sucedem são compostas das mesmas individualidades espirituais que renascem em diferentes épocas e tiram proveito dos melhoramentos que elas próprias prepararam; da experiência que adquiriram no passado. Não são novos homens que nascem; são os mesmos homens que renascem mais adiantados. Trabalhando cada geração para o futuro, na realidade trabalha em proveito próprio. A Idade Média foi seguramente uma época muito calamitosa; revivendo hoje, os homens daquele tempo se beneficiam do progresso realizado e são mais felizes, porque têm melhores instituições. Mas, quem fez melhores essas instituições? Os mesmos que outrora as tinham feito más. Devendo os de hoje reviver mais tarde, num meio ainda mais depurado, colherão o que houverem semeado; serão mais esclarecidos, e nem os seus sofrimentos, nem seus trabalhos anteriores terão sido em pura perda. Que coragem, que resignação não lhes daria esta ideia, inculcada no espírito dos homens! (Vide A Gênese, Cap. XVIII, nº 34 e 35).
Dissertação dos Espíritos
Ontem, hoje e amanhã
Comunicação verbal em sonambulismo espontâneo. Médium Sr. Dubois.
Lyon, 2 de fevereiro de 1868,
Onde estamos hoje? Onde está a luz? Tudo é sombrio, tudo está turvo ao redor de nós. Ontem era o passado; amanhã será o futuro; hoje é o presente... O que distingue estes dias? Vivemos ontem, continuamos vivendo hoje, viveremos amanhã, e sempre no mesmo círculo. De onde sai, então, esta Humanidade, e para aonde vai ela? Mistério que só será esclarecido amanhã.
Moisés é o tempo passado; o Cristo, o tempo presente; o Messias a vir, que é o amanhã, ainda não apareceu... Moisés tinha que combater a idolatria; o Cristo, os fariseus; o Messias a vir terá também os seus adversários: a incredulidade, o ceticismo, o materialismo, o ateísmo e todos os vícios que abatem o gênero humano... Três épocas que marcam o progresso da Humanidade; parênteses filiais que se sucedem um ao outro; ontem era Moisés, hoje é o Cristo e amanhã será o novo Messias.
Digo que é o Cristo hoje, porque é a sua palavra, a sua doutrina, a sua caridade, todos os seus sublimes ensinamentos devem espalhar-se por toda parte; porque, vós mesmos o vedes, a Humanidade não progrediu muito. Apenas dezoito séculos nos separam do Cristo: dezoito séculos de trevas, de tirania, de orgulho e de ambição.
Considerai o passado, o presente, amanhã contemplareis o vosso futuro... Idólatras do passado, fariseus do presente, adversários do amanhã, a luz brilha para todos os povos, para todos os mundos, para todos os indivíduos, e não quereis vê-la!
Criatura, tu desanimas hoje, que é o presente; tu esperas a realização dos prodígios anunciados; tu os verás se realizarem. Em breve toda a Terra tremerá... O século XX ofuscará o brilho dos séculos passados, porque ele verá a realização do que foi predito.
O Messias que deve presidir ao grande movimento regenerador da Terra já nasceu, mas ainda não revelou a sua missão e não nos é permitido dizer nem o seu nome nem o país onde ele habita. Ele anunciar-se-á por suas obras, e os homens tremerão à sua voz potente, porque o número dos justos ainda é muito pequeno.
Ligai-vos à matéria, homens egoístas e ambiciosos que não viveis senão para satisfazer as vossas paixões e os vossos desejos mundanos. O tempo é curto para vós; tende-o, enlaçai-o, porque ontem é passado, hoje se põe e em breve será amanhã.
Vamos! fariseu do presente, tu esperas sempre. Que ronque o trovão, tu não te espantas diante do relâmpago precursor que vem deslumbrar os teus olhos. Tu que te comprazes no egoísmo e no orgulho, que persistes no passado e no presente, teu futuro é ser arrojado para um outro mundo, para que teu Espírito possa chegar um dia à perfeição a que Deus te chama.
Vós, espíritas, que estais aqui, que recebeis instruções dos Espíritos, sede pacientes, dóceis, conscientes de vossos atos; não vacileis; esperai com calma esse amanhã que vos deve livrar de todas as perseguições. Deus, para o qual nada é oculto, que lê nos corações, vos vê e não vos abandonará. A hora se aproxima, e em breve estaremos no amanhã.
Mas esse Messias que deve vir é o próprio Cristo? Pergunta difícil de compreender no momento presente, e que amanhã será esclarecida. Como um bom pai de família, Deus, que é todo sabedoria, não impõe todo o trabalho a um só de seus filhos. Ele atribui a cada um a sua tarefa, segundo as necessidades do mundo para onde os envia. Há que concluir que o novo Messias não será tão grande nem tão poderoso quanto o Cristo? Seria absurdo; mas esperai que soe a hora para compreender a obra dos mensageiros invisíveis, que vieram varrer o caminho, porque os Espíritos fizeram um imenso trabalho. É o Espiritismo que deve remover as grandes pedras que poderiam dificultar a passagem daquele que deve vir. Esse homem será poderoso e forte, e numerosos Espíritos estão na Terra para aplainar o caminho e fazer cumprir o que foi predito.
Esse novo Messias será chamado o Cristo? É uma pergunta a que não posso responder. Esperai até amanhã. Quantas coisas eu teria ainda a vos revelar! Mas eu paro, porque o dia de amanhã ainda não aparece. Estamos apenas antes da meianoite.
Amigos que estais aqui, todos animados pelo desejo do vosso adiantamento moral, trabalhai sobre vós mesmos pela vossa regeneração, a fim de que o Mestre vos encontre preparados. Coragem, irmãos, porque o vosso esforço não será perdido. Trabalhai para quebrar os laços da matéria que impedem o Espírito de progredir.
Tende fé, porque ela conduz o homem com segurança ao fim de sua viagem. Tende amor, porque amar aos seus irmãos é amar a Deus. Vigiai e orai: a prece fortalece o Espírito que se deixa tomar pelo desânimo. Pedi ao vosso Pai celeste a força para triunfardes ante os obstáculos e as tentações. Armai-vos contra os vossos defeitos; mantende-vos prontos, porque o amanhã não está longe. A aurora do século marcado por Deus para a realização dos fatos que devem mudar a face deste mundo começa a surgir no horizonte.
O ESPÍRITO DA FÉ.
ALLAN KARDEC
Lyon, 2 de fevereiro de 1868,
Onde estamos hoje? Onde está a luz? Tudo é sombrio, tudo está turvo ao redor de nós. Ontem era o passado; amanhã será o futuro; hoje é o presente... O que distingue estes dias? Vivemos ontem, continuamos vivendo hoje, viveremos amanhã, e sempre no mesmo círculo. De onde sai, então, esta Humanidade, e para aonde vai ela? Mistério que só será esclarecido amanhã.
Moisés é o tempo passado; o Cristo, o tempo presente; o Messias a vir, que é o amanhã, ainda não apareceu... Moisés tinha que combater a idolatria; o Cristo, os fariseus; o Messias a vir terá também os seus adversários: a incredulidade, o ceticismo, o materialismo, o ateísmo e todos os vícios que abatem o gênero humano... Três épocas que marcam o progresso da Humanidade; parênteses filiais que se sucedem um ao outro; ontem era Moisés, hoje é o Cristo e amanhã será o novo Messias.
Digo que é o Cristo hoje, porque é a sua palavra, a sua doutrina, a sua caridade, todos os seus sublimes ensinamentos devem espalhar-se por toda parte; porque, vós mesmos o vedes, a Humanidade não progrediu muito. Apenas dezoito séculos nos separam do Cristo: dezoito séculos de trevas, de tirania, de orgulho e de ambição.
Considerai o passado, o presente, amanhã contemplareis o vosso futuro... Idólatras do passado, fariseus do presente, adversários do amanhã, a luz brilha para todos os povos, para todos os mundos, para todos os indivíduos, e não quereis vê-la!
Criatura, tu desanimas hoje, que é o presente; tu esperas a realização dos prodígios anunciados; tu os verás se realizarem. Em breve toda a Terra tremerá... O século XX ofuscará o brilho dos séculos passados, porque ele verá a realização do que foi predito.
O Messias que deve presidir ao grande movimento regenerador da Terra já nasceu, mas ainda não revelou a sua missão e não nos é permitido dizer nem o seu nome nem o país onde ele habita. Ele anunciar-se-á por suas obras, e os homens tremerão à sua voz potente, porque o número dos justos ainda é muito pequeno.
Ligai-vos à matéria, homens egoístas e ambiciosos que não viveis senão para satisfazer as vossas paixões e os vossos desejos mundanos. O tempo é curto para vós; tende-o, enlaçai-o, porque ontem é passado, hoje se põe e em breve será amanhã.
Vamos! fariseu do presente, tu esperas sempre. Que ronque o trovão, tu não te espantas diante do relâmpago precursor que vem deslumbrar os teus olhos. Tu que te comprazes no egoísmo e no orgulho, que persistes no passado e no presente, teu futuro é ser arrojado para um outro mundo, para que teu Espírito possa chegar um dia à perfeição a que Deus te chama.
Vós, espíritas, que estais aqui, que recebeis instruções dos Espíritos, sede pacientes, dóceis, conscientes de vossos atos; não vacileis; esperai com calma esse amanhã que vos deve livrar de todas as perseguições. Deus, para o qual nada é oculto, que lê nos corações, vos vê e não vos abandonará. A hora se aproxima, e em breve estaremos no amanhã.
Mas esse Messias que deve vir é o próprio Cristo? Pergunta difícil de compreender no momento presente, e que amanhã será esclarecida. Como um bom pai de família, Deus, que é todo sabedoria, não impõe todo o trabalho a um só de seus filhos. Ele atribui a cada um a sua tarefa, segundo as necessidades do mundo para onde os envia. Há que concluir que o novo Messias não será tão grande nem tão poderoso quanto o Cristo? Seria absurdo; mas esperai que soe a hora para compreender a obra dos mensageiros invisíveis, que vieram varrer o caminho, porque os Espíritos fizeram um imenso trabalho. É o Espiritismo que deve remover as grandes pedras que poderiam dificultar a passagem daquele que deve vir. Esse homem será poderoso e forte, e numerosos Espíritos estão na Terra para aplainar o caminho e fazer cumprir o que foi predito.
Esse novo Messias será chamado o Cristo? É uma pergunta a que não posso responder. Esperai até amanhã. Quantas coisas eu teria ainda a vos revelar! Mas eu paro, porque o dia de amanhã ainda não aparece. Estamos apenas antes da meianoite.
Amigos que estais aqui, todos animados pelo desejo do vosso adiantamento moral, trabalhai sobre vós mesmos pela vossa regeneração, a fim de que o Mestre vos encontre preparados. Coragem, irmãos, porque o vosso esforço não será perdido. Trabalhai para quebrar os laços da matéria que impedem o Espírito de progredir.
Tende fé, porque ela conduz o homem com segurança ao fim de sua viagem. Tende amor, porque amar aos seus irmãos é amar a Deus. Vigiai e orai: a prece fortalece o Espírito que se deixa tomar pelo desânimo. Pedi ao vosso Pai celeste a força para triunfardes ante os obstáculos e as tentações. Armai-vos contra os vossos defeitos; mantende-vos prontos, porque o amanhã não está longe. A aurora do século marcado por Deus para a realização dos fatos que devem mudar a face deste mundo começa a surgir no horizonte.
O ESPÍRITO DA FÉ.
ALLAN KARDEC